QUAL O TRATAMENTO LEGAL CONFERIDO PELA NOVA LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATAÇÕES PÚBLICAS ACERCA DA GARANTIA DE PROPOSTA?

De acordo com o art. 58 da nova lei de licitações, a Administração tem a faculdade de exigir em edital, no momento da apresentação da proposta, como requisito de pré-habilitação, a comprovação do recolhimento de quantia como garantia de proposta, cujo montante não deve extrapolar 1% (um por cento) do valor estimado para a contratação.

A lei, ainda, estabelece que a garantia da proposta pode ser apresentada em uma das modalidades previstas no art. 96, §1º, e não veda o uso para o pregão, hipótese, até então, vedada pela Lei 10.520/02.

Do texto legal prescrito no §2º do art. 58 inferimos também que a garantia de proposta deve ser devolvida aos licitantes no prazo de 10 (dez) dias úteis, contado da assinatura do contrato ou da data em que for declarada fracassada a licitação. A recusa em assinar o contrato ou a não apresentação dos documentos para a contratação, acarreta, segundo o §3º, a execução do valor integral da garantia de proposta.

Marçal Justen Filho tece crítica à redação do dispositivo ao afirmar que o depósito no valor de 1% não se configura como “um requisito de ‘pré-habilitação’ – figura desconhecida”, mas uma condição de participação no certame, que visa “neutralizar os efeitos nocivos da admissão de propostas de licitantes de origem e qualificação desconhecida”. (JUSTEN FILHO, Comentários…, 2021, RL-1.16, ebook)

Além de criticar a redação do dispositivo, o administrativista também o considera inconstitucional à luz do art. 37, inc. XXI, da CF/88. Sublinha que a exigência viola o princípio da proporcionalidade-adequação, pois a garantia não gera qualquer benefício à Administração. “A formulação de propostas por licitantes não é apta a gerar riscos de danos ao patrimônio. Logo, não existe uma finalidade autônoma de garantia a ser preenchida”; como também não se alinha ao princípio da proporcionalidade-necessidade, pois, em tese, todas as exigências que envolvam custos podem apenas ser requeridas do potencial contratado, tal como ocorre na questão das amostras:

“A exigência da garantia da proposta configura uma exigência que afeta negativamente aos licitantes, implicando custos e perdas – eis que somente um dos licitantes será contratado, ao final do certame. Todos os demais terão de arcar com os custos do cumprimento de uma formalidade desnecessária, que não propicia qualquer vantagem à Administração. Esse custo, em última análise, será repassado para a proposta”. (JUSTEN FILHO, ebook, RL-1.16).

Como quer que seja, à luz do texto legal, é possível requer garantia de proposta dos licitantes interessados em participar. A doutrina, porém, alerta que tal exigência deve ocorrer somente quando efetivamente vantajosa para Administração, visto que aumenta custos e restringe a competição, e, por conta disso, a sua adoção e o seu montante devem ser justificados já na fase de planejamento. (TORRES, Ronny C. L. Lei de Licitações, 2021, p. 322).

 

[1] Doutora, com período de sanduíche na Scuola Normale Superiore di Pisa (SNS), e mestre pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Possui estágio pós-doutoral em Direito na UFPR. Possui pós-graduação em Direitos Fundamentais pela Universidade de Burgos da Espanha e em Teoria do Direito e Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst). Professora e pesquisadora em História do Direito e Direito Público. Consultora jurídica com mais de 10 anos de experiência e atuação na área de licitações e contratos administrativos.  Colaboradora da Revista RJML de Licitações e Contratos.

Danielle Regina Wobeto de Araujo

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