AS JORNADAS DO LÍDER: O QUE GERA MAIOR IMPACTO NA LIDERANÇA?

Um líder é uma pessoa que tem um grau incomum de poder para projetar sobre outras pessoas a sua sombra ou a sua luz. Um líder é uma pessoa que deve assumir uma responsabilidade especial pelo que está acontecendo dentro de si mesmo, para que o ato de liderança não cause mais mal do que bem. (Parker J Palmer).

 Esta maneira de pensar sobre a liderança coloca ênfase na reflexão, no autoconhecimento e na compreensão de si como líder como uma condição para exercer a liderança com menor impacto negativo nas pessoas e no seu entorno.

Ao pensar no Desenvolvimento da Liderança de uma organização torna-se útil desdobrar a jornada em Etapas ou Trilhas de Aprendizagem que contribuem com a Trajetória do líder e do Gestor.

1ª Etapa da Trilha:

Autoconhecimento – Busca e Compreensão de Si mesmo como indivíduo

A qualidade de nossa Liderança começa pela jornada do eu. Nossa natureza está entrelaçada com nossas raízes, o que somos, onde nascemos e crescemos, nossas interações com o MUNDO e as pessoas com quem convivemos na infância e vida adulta e as referências que construímos ao longo do tempo. Ter contato com a nossa história e olhar por novas lentes e outros ângulos, buscar compreender esta experiência e dar novas interpretações a ela na busca de novos aprendizados de si, das pessoas e do ambiente que nos formou.

Como líderes, nossa tarefa nesta jornada é refletir e tornar consciente nossos pontos fortes e pontos excessivos que podem levar ás nossas fraquezas, numa atitude responsável com sua caminhada pessoal, o que representou a caminhada real na forma como nos relacionamos com as pessoas, como reagimos e julgamos as situações cotidianas e como lidamos com as complexidades, volatilidades e incertezas da vida profissional e pessoal.

Quando estamos em equilíbrio e conscientes de si mesmos, somos mais capazes de enfrentar os desafios adaptativos – presentes e inerentes ao Mundo Corporativo – que demanda cada dia mais a correspondência entre capacidades e desafios numa dança veloz que demanda “Estar em Fluxo” – Confiante, Competente e Entusiasmado.

Segundo Siqueira e Padovam (2008), esse conceito tem relação com a ideia de fluxo criada por Csikszentmihalyi (1999), que define esse estado como uma sensação de ação sem esforço, como as que ocorrem nos melhores momentos de vida do indivíduo, ou seja, as habilidades totalmente voltadas para a superação de um desafio que está no limite da capacidade de controle. Geralmente, essas experiências envolvem um equilíbrio entre a capacidade de o indivíduo agir e as oportunidades disponíveis para a ação. Entende-se que o trabalho pode ser uma oportunidade para oferecer condições para que o indivíduo entre em fluxo (Csikszentmihalyi, 2003).

Quando isso ocorre, a organização ganha em decisões, em desempenho, fluidez e engajamento de pessoas, setores, pares e colaboradores.

Líderes e organizações têm a responsabilidade de refletir e apoiar o crescimento da Liderança em prol das Organizações e estimular esses padrões individuais de crescimento, visto que a Gestão é a mola propulsora dos seus projetos, compromissos e resultados. Refletir sobre a capacidade de crescimento gerencial e de Liderança ao longo do tempo como elemento principal na prontidão para enfrentar as complexidades e incertezas de seu papel de liderança.

De acordo a pesquisa da profa. inglesa Gillian Stamp,   quando os líderes não estão “em fluxo”, eles – como qualquer outra pessoa – não serão capazes de entender as ambigüidades, as interconexões e as imprevisibilidades de seu trabalho, e assim terão dificuldade em tomar decisões robustas. E – este é um elemento-chave de liderança – eles serão muito menos capazes de fornecer as condições em que outros possam usar seu julgamento sabiamente para sustentar a o Contínuo de Mudanças a qual está sujeita a  organização Contemporânea. A Resiliência é capacidade do indivíduo de lidar com problemas, adaptar-se à diferentes situações, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas , como condição necessária mas não suficiente para uma liderança eficaz, é essencial em condições voláteis e complexas.

2ª Etapa da Trilha:

A segunda etapa da TRILHA É A JORNADA PROFISSIONAL no trabalho, onde nossa capacidade é testada e afirmada – ou não, por meio das entregas que fazemos e dos impactos que produzimos no ambiente. É nesta jornada que a liderança é expressa e as responsabilidades são claras.

Nesta etapa muitos desafios são agregados a caminhada. Um dilema freqüente dos líderes nesta jornada é administrar os recursos escassos, tomar decisões, entregar valor e controlar os custos, além de manter relacionamentos de alta qualidade com pessoas (clientes, funcionários, parceiros, fornecedores, comunidades). Essas pressões cotidianas e os desafios crescentes exigem capacidades que vão muito além dos conhecimentos técnicos e na maioria das vezes, imperceptíveis pelo contexto organizacional.

A Jornada Profissional exige de todos – líderes e colaboradores doses extras de coragem, persistência, equilíbrio dos seus diferentes papéis e estar desperto para a relevância dos impactos dos seus sentimentos, crenças e fortalezas que invariavelmente afetam o seu desempenho de líder.

Nesta Jornada, importante não descuidar do seu contínuo crescimento como líder e como ser humano para desenvolver musculatura profissional para enfrentar os desafios inerentes a liderança e sustentar sua posição ao longo do tempo.

A Jornada Profissional e a Jornada do Autoconhecimento ou do EU precisam estar bem alinhadas e em equilíbrio – isto significa estar em Estado de “Fluxo”. Ao líder cabe, buscar essa experiência para si mesmo e conquistar recursos e oportunidades para assumir o papel de fornecer condições para que a sua equipe possa também experimentar o Estado de “Fluxo”.

Nas pesquisas de Mihaly Csikszentmihalyi, 2003,entrevistando alpinistas, monges, pastores e uma variedade enorme de pessoas com diferentes níveis de educação e cultura, existem elementos comuns que indicam o que é estar no estado de fluxo:

1.       Completamente envolvido no que se está fazendo: com foco e concentração;
2.      Um sentimento de êxtase, de estar fora da realidade do dia a dia;
3.      Uma maior claridade interna, sabendo o que deve ser feito e quão bem estamos fazendo o que deve ser feito. Temos feedback imediato;
4.      Saber que a atividade é possível, que nossas habilidades são adequadas para a tarefa;
5.      Um sentimento de serenidade, sem preocupações e um sentimento de estar crescendo além dos limites do ego;
6.      Uma idéia de estar além da dimensão temporal, totalmente focado no momento presente. As horas parecem passar como se fossem minutos;
7.      Motivação intrínseca seja qual for o elemento que produz o flow é a nossa própria recompensa.

3ª Etapa da Trilha:

A TRILHA PRIVADA é o espaço da vida compartilhado com a família, amigos e sua comunidade, sendo aqui uma JORNADA da convivência com as pessoas mais próximas e significativas da sua existência. Casamentos, filhos, papéis diversos como pai, mãe, filho, filha, afetividades, identidades que precisam se expressar e se afirmar ao longo da vida. 

A Gestão da Carreira da liderança exige aqui os diferentes estágios da vida do parceiro(a) em que cada um assume um papel principal e ou secundário de acordo com as necessidades de cada família, o que torna esta Jornada delicada e importante. 

No Brasil, estamos presenciando uma mudança significativa na forma das famílias lidarem com suas carreiras, de forma que as novas gerações cada vez mais abrem espaço para o planejamento profissional de ambos os parceiros com a participação mais efetiva do homem nas responsabilidades familiares e dos filhos.

No exercício da Liderança esta mudança acrescenta pressões e expectativas que de um lado exige maior equilíbrio entre as Jornadas e de outro, possibilita um nível de aprofundamento nas relações com seus filhos e familiares como um todo.

Diante desse novo cenário PRIVADO, surgem pressões na Jornada pública que nem sempre serão compreendidas e bem tratadas no âmbito profissional, o que requer um nível de consciência mais amplo e mais fluído – que é um momento de maior exigência pessoal – que nem sempre conseguimos reconhecê-lo com clareza e leveza, mais que comporta efeitos significativos na nossa liderança.

Nesta Etapa, é comum sentir-se sobrecarregado e com um peso extra para aqueles com quem compartilhamos o espaço privado. Ora podemos nos sentir culpados por não assumir tudo o que gostaríamos nesta fase da vida e nem sempre temos apoio ou esclarecimento adicional de que é apenas uma fase transitória necessária ao crescimento de um Projeto Pessoal maior. 

Concorrendo com este dilema interior estará forte e demandante as responsabilidades profissionais preementes – como a geração e administração dos recursos, os projetos, a Gestão das pessoas, os resultados organizacionais – tudo ao mesmo tempo e o líder deverá equilibrar e lidar com as inesperadas complexidades da vida privada e profissional. 

Neste estágio cabe uma pausa para refletir e aprender com esta Etapa e resolver a questão da escolha de onde há mais significado para colocar nossa energia e dedicação. Pausa que permitirá ampliar a visão dos diferentes papéis e significados de cada um na vida presente e futura e do quão é possível, equalizar para não invalidar continuidades relevantes.

4ª Etapa da Trilha: A PESSOAL

Nossa quarta TRILHA é pessoal.  É a jornada na qual fazemos algo por nós mesmos ou não, cuidamos de nós e garantimos a energia vital para lidar com as demais áreas da vida. Trata-se de encontrar-se e expressar-se de forma a ganhar força interna, energia adicional para os enfretamentos profissionais e pessoais. 

Esta JORNADA pode ser expressa por atividades que dão prazer e renovam nossas energias emocionais como correr, caminhar, ouvir música, andar a cavalo, pintar, cozinhar, bater papo com os amigos, dançar, navegar, praticar seu esporte preferido. 

Damos pouco ou nenhum valor a JORNADA pessoal, quase sempre estamos muito ocupados para abrir espaços para renovar as energias até o ponto que uma crise de saúde ou de trabalho promovem o repensar da vida, porque aqui está a manutenção do seu eu elevado, seu melhor potencial, a rotação do dia a dia que permite trocas energéticas para acessar nossos melhores recursos internos. 

Conectar-se consigo e com os melhores recursos internos a fim de potencializar nossa capacidade como líderes, saber o que fazer em momentos de dúvidas e incertezas, tomar decisões sábias e coerentes, compreender o entorno e o contexto de forma mais assertiva, encontrando dentro de si as escolhas mais adequadas na teia da vida. 

Para o líder, cuidar de si representa aprofundar a reflexão de como pensamos, como reagimos às incertezas e complexidades inerentes a Gestão, como respondemos às mudanças e como lidamos com as Adversidades do nosso cotidiano. Como nossas crenças limitam ou fortalecem nossas ações e mobilizam nossos recursos mais preciosos. Neste momento, apoiar-se num Mentor ou Coach gera resultados surpreendentes, na medida em que contamos com apoio profissional para ampliar nossa lente interna e expandir nosso olhar para nossas escolhas.

Sem isso, podemos viver sem luz, não nos apropriando do que temos de melhor, ou podemos optar por nos tonar mais conscientes dos nossos gatilhos emocionais que nos impulsionam, criando nosso “Fluxo” e nos aproximando de nossos pontos cegos – a parte de como os “outros” nos vêem quando estamos fora do “Fluxo”, permitindo-nos calibrar-se novamente e retomar o caminho. 

Isto possibilita resgatar a confiança em si e nos outros. Só equilíbrio interno pode restaurar a tranqüilidade que vem de dentro e que guia o líder para decidir com confiança e acessar todos os seus recursos e capacidades.

Um líder tem uma responsabilidade adicional de  reconhecer quando ele ou ela está fora de ‘fluxo’, e como recuperá-lo – que se reflete no bem-estar das pessoas lideradas e da organização como um todo.

JACQUELINE MENDES MENEZES

Especialista em Gestão de Pessoas pela PUC/PR. Mestre em Engenharia da Produção com ênfase em Mídia e Conhecimento (UFSC), Formação de Desenvolvimento de Líderes pela Franklin Covey e Formação em Coach certificada pelo ICI e membro da ICF. Pesquisadora de Liderança, Gestão Contemporânea e PNL aplicada à Gestão.
Especialista em Gestão com experiência profissional Executiva e Formação Gerencial e Liderança. Experiência profissional de 30 anos como gestora e com soluções de aprendizado e gestão de pessoas. Atua desde 1998 na formação de gestores e líderes. Vivência de mais de 20 anos com Treinamento e desenvolvimento de adultos, tendo como foco a formação de gestores. Participou e Coordenou em 2013 pela JML, a Missão Técnica Internacional de Gestão de Pessoas e RH da JML nas cidades de Washington, Boston e Nova York, EUA.

Publicações recentes

Margem de Preferência nas Compras Públicas: A Nova Regulamentação pelo Decreto nº 12.218/2024 

Por:

Introdução  O Decreto nº 12.218, de 11 de outubro de 2024, estabelece novas diretrizes para a aplicação da margem de […]

25 de novembro de 2024

Discricionariedade e Transparência nas Contratações das Entidades do Sistema S: Lições do Acórdão 1998/2024 do TCU 

Por:

A discricionariedade administrativa é um princípio fundamental no Direito Administrativo, permitindo ao agente um espaço para tomar decisões que atendam […]

18 de novembro de 2024

Controle Judicial da Discricionariedade Administrativa: Um Paralelo com a Atuação do Agente Público nos Processos Licitatórios e o Artigo 28 da LINDB 

Por:

1. Introdução:  A discricionariedade administrativa é um conceito central no Direito Administrativo e na atuação dos agentes públicos. Ela se […]

1 de novembro de 2024