O desenvolvimento e utilização massiva da Inteligência Artificial (IA) não é mais uma tendência. É um fato, de alcance global e com impactos sociais e econômicos relevantes. Como uma tecnologia de propósito geral, a IA funciona como base para que outras sejam criadas a partir dela. E por ter se tornado uma “super ferramenta” que permite resolver problemas multidisciplinares em grande escala, o impacto do seu uso, para o bem ou para o mal, é de interesse geral e coletivo.
O desenvolvimento de IA já é urgente, e se transformou em assunto estratégico para países, sociedades, corporações e governos. Contudo, sua evolução precisa ser ajustada para cada realidade, sociedade, negócio, problemas e limitações locais. A regulação da IA no Brasil é essencial para que se possa discutir amplamente o tema e iniciar ações efetivas para resolver os nossos problemas.
Uma Estratégia Nacional de Inteligência Artificial é fundamental. E estamos no caminho. Uma 1ª versão elaborada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Comunicações foi (re)submetida a consulta pública. Aberta para contribuições até 2 de março, a estratégia é dividida em 6 eixos, entre eles legislação, governança, capacitação e uso ético, e o objetivo é potencializar o desenvolvimento e a utilização da tecnologia com vistas a promover o avanço científico e solucionar problemas concretos do país. É um passo fundamental para a regulação do tema no Brasil.
Mas atenção: regular não é [nem deveria ser] sinônimo de burocratizar. Por [auto]regulação entende-se o conjunto de ajustes necessários –alguns normativos– para resolver um problema. Regular a IA compreende, portanto e para além de uma Estratégia Nacional, promover ajustes específicos em outras políticas, como parâmetros de políticas de educação, incentivos à pesquisa e desenvolvimento, fomento e desenvolvimento de negócios baseados em IA e construção de alternativas para atração de investimentos globais.
Nesse sentido, uma publicação recente do The Washington Post informa sobre a iniciativa norte-americana de descrever procedimentos detalhados para garantir que aplicações de IA tenham a apropriada verificação publica e privada. A orientação torna obrigatória, para cada agência (equivalente aos nossos ministérios), a construção de um plano de gestão de riscos de IA individual para cada área (saúde, educação, infraestrutura, defesa etc), voltado ao desenvolvimento de empresas americanas.
O documento ressalta ainda que a regulação deve estimular a inovação e o crescimento, além de buscar a confiança dos cidadãos americanos, com o foco de reduzir barreiras desnecessárias para o desenvolvimento e utilização da IA. A mensagem é clara: as agências devem evitar abordagens excessivamente precavidas que podem atrapalhar a sociedade de aproveitar os seus benefícios. Onde há riscos, será necessário considerá-los sobre a ótica dos benefícios e dos custos para tratá-los, usando como regra que a prioridade é o estímulo às políticas de IA.
Qualquer regulação que declare de maneira explícita a prioridade na evolução da indústria de IA deve ser celebrada. Mas não é tão simples. O objetivo da regulação não pode ser acelerar sem cuidado, nem frear sem motivo, mas manter em movimento seguro e em direção clara: para frente e agora. No Brasil, já temos bons mercados de IA em evolução nos ramos #lawtech, #fintech e #agrotech, com ações estruturadas e investimento crescente. Mas as dificuldades são muitas, mesmo para elas.
É preciso reforçar o discurso e colocar de vez a evolução da IA nacional na pauta das políticas públicas. A transparência, a participação e o debate sobre a economia ao redor da IA, inclusive no Congresso Nacional, são fundamentais para construir e sustentar a confiança pública no desenvolvimento de novos mercados e nas aplicações possíveis de IA, sempre a partir de limites éticos. E a contribuição de todos para a construção da Estratégia Nacional de IA é uma ação prática nesse sentido.
A IA é talvez o maior produto vivo da globalização desde a Internet. E regulações específicas, adaptadas aos problemas e à realidade brasileira, tendem a dar efetividade e conferir pragmatismo às ações futuras.
Ou se avança no estabelecimento de uma nova economia ou se aprofundará uma situação de “colonização virtual”, onde a sociedade incluída digitalmente continua a usufruir dos confortos deste século e a ocupar postos de trabalho do século passado, com baixa produtividade. Essa situação nos mantém como tradicionais exportadores de matéria-prima, mas agora ainda mais valiosa: nossos dados e profissionais de vanguarda.
Wesley Vaz
É servidor público federal, profissional certificado em estratégia e inovação pelo MIT e mestre em Ciência da Computação pela Unicamp. Co-autor do livro “A descomplicada contratação de TI na Administração Pública”.
Fonte: PODER 360 – https://www.poder360.com.br/opiniao/tecnologia/a-regulacao-inteligente-da-inteligencia-artificial-e-essencial-afirma-wesley-vaz/