SERVIÇO CONTÍNUO. É OU NÃO É? EIS A QUESTÃO.

Como se sabe, a Lei nº 8.666/93 admite a prorrogação dos contratos de serviços contínuos por até 60 meses.[1]

Mas afinal, como saber se um serviço tem natureza contínua ou não? Essa questão parece simples de ser respondida quando estamos diante de um serviço rotineiro, tal qual o serviço de limpeza, cuja execução é realizada dia após dia durante a vigência do contrato.

No entanto, existem alguns serviços que não são realizados diariamente, mas cuja necessidade da Administração permanece com frequência (semanal, mensal, trimestral, etc.). É aquela necessidade que não se satisfaz com a execução/conclusão/entrega de determinado objeto (exemplo clássico, execução de uma obra, que se trata de um contrato por escopo), mas é aquela demanda que se renova com o tempo, exigindo, portanto, execução continuada.

Marçal Justen Filho leciona sobre o tema no seguinte sentido:

“A identificação dos serviços de natureza contínua não se faz a partir do exame propriamente da atividade desenvolvida pelos particulares, como execução da prestação contratual. A continuidade do serviço retrata, na verdade, a permanência da necessidade pública a ser satisfeita. Ou seja, o dispositivo abrange os serviços destinados a atender necessidades públicas permanentes, cujo atendimento não exaure prestação semelhante no futuro.

Estão abrangidos não apenas serviços essenciais, mas também as necessidades públicas permanentes relacionadas com atividades de menor relevância (tal como limpeza, por exemplo). O que é fundamental é a necessidade pública permanente e contínua a ser satisfeita através de um serviço.”[2] (grifou-se)

Além da frequência/permanência da demanda, o serviço contínuo, se interrompido, pode comprometer o cumprimento regular da missão institucional do ente contratante.

Nessa linha, o entendimento do Tribunal de Contas da União:

Serviços de natureza contínua são serviços auxiliares e necessários à Administração, no desempenho de suas atribuições, que se interrompidos podem comprometer a continuidade de suas atividades e cuja contratação deva estender-se por mais de um exercício financeiro.

A Administração deve definir em processo próprio quais são seus serviços contínuos, pois o que é contínuo para determinado órgão ou entidade pode não ser para outros. São exemplos de serviços de natureza contínua: vigilância, limpeza e conservação, manutenção elétrica e manutenção de elevadores.

Em processo próprio, deve a Administração definir e justificar quais outros serviços contínuos necessita para desenvolver as atividades que lhe são peculiares”[3] (grifou-se).

 

“Deve ser observado atentamente o inciso II do art. 57 da Lei nº 8.666, de 1993, ao firmar e prorrogar contratos, de forma a somente enquadrar como serviços contínuos contratos cujos objetos correspondam a obrigações de fazer e a necessidades permanentes.[4] (grifou-se)

 

“(…) a natureza contínua de um serviço não pode ser definida de forma genérica. Deve-se, isso sim, atentar para as peculiaridades de cada situação examinada.
Na realidade, o que caracteriza o caráter contínuo de um determinado serviço é sua essencialidade para assegurar a integridade do patrimônio público de forma rotineira e permanente ou para manter o funcionamento das atividades finalísticas do ente administrativo, de modo que sua interrupção possa comprometer a prestação de um serviço público ou o cumprimento da missão institucional.”[5] (grifou-se).

Destarte, conforme se observa, para que determinado serviço venha a ser considerado de natureza contínua é necessário que cada órgão ou entidade demonstre a sua essencialidade, bem como a necessidade de ser prestado habitualmente, sob pena de a sua paralisação comprometer o desempenho de suas atividades finalísticas.

Portanto, será a necessidade permanente de determinado serviço tido como essencial que conduzirá à sua caracterização como contínuo, cabendo ao ente contratante avaliar as características e condições específicas do serviço que pretende contratar a fim de aferir se o mesmo pode ou não ser assim considerado.

Ressalte-se que não há um rol de serviços que possam ser considerados contínuos em todo e qualquer caso e nem poderia existir, porquanto aquilo que é contínuo para determinado órgão ou entidade pode não ser para outro, cabendo a cada um estipular, em processo próprio e diante de sua realidade institucional, quais são os serviços que devem ser considerados como contínuos, para fins de manutenção da contratação por períodos mais longos, de modo a se obter condições mais vantajosas para a contratação.


[1] “Art. 57 A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos: (…) II – à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses”.
[2] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo: 2016, p. 1109.
[3] BRASIL. Tribunal de Contas da União(TCU). Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4. ed. rev., atual. e ampl. – Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência: Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010, p. 772.
[4] TCU. Decisão 1136/2002. Plenário.
[5] TCU. Acórdão 132/2008. Segunda Câmara.

Ana Carolina Coura Vicente Machado

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