Rafaela Ramiro Pontes[1]
RESUMO
O Sistema de Registro de Preços (SRP) é uma ferramenta essencial para a administração pública, especialmente em contextos de restrição orçamentária e demandas variáveis. Regulamentado pela Lei nº 14.133/2021, o SRP permite a contratação de bens e serviços de forma planejada e eficiente, favorecendo a flexibilidade, a economicidade e a simplificação dos processos licitatórios. Uma das inovações trazidas pela nova legislação é a exigência de previsão de quantitativos mínimos e máximos nos editais, o que promove maior previsibilidade para fornecedores e contribui para a competitividade do mercado. No entanto, a fixação de quantitativos mínimos apresenta desafios, como a possível rigidez no atendimento às demandas e o risco de superestimação, exigindo planejamento criterioso e diálogo com o mercado. Este artigo analisa os benefícios e as dificuldades dessa prática, oferecendo reflexões sobre como equilibrar flexibilidade e previsibilidade para otimizar o uso dos recursos públicos.
Palavras-chave: Sistema de Registro de Preços, Quantitativos Mínimos, Economia de Escala, Licitações e Contratos Administrativos.
- Introdução
A Lei nº 14.133/2021 trouxe inovações significativas para o âmbito das licitações e contratos administrativos no Brasil, incorporando práticas de governança e gestão orientadas pela eficiência. Entre os mecanismos estabelecidos, o Sistema de Registro de Preços (SRP) sobressai como uma ferramenta estratégica, especialmente útil em contextos onde a demanda é incerta ou os momentos de contratação não podem ser antecipados com precisão. Essa característica confere ao SRP uma flexibilidade que o torna indispensável para o planejamento eficiente das aquisições públicas.
Este artigo explora o SRP sob a perspectiva da nova legislação, com foco nas exigências relativas à definição de quantitativos mínimos nos editais, uma inovação que busca equilibrar a previsibilidade para fornecedores com a flexibilidade administrativa.
A importância desse tema reside na sua capacidade de alinhar o planejamento interno da administração pública às condições de mercado, promovendo contratações mais competitivas e vantajosas.
Por outro lado, sua aplicação prática exige um rigoroso planejamento para evitar riscos, como superestimação ou comprometimento da eficiência do gasto público. Assim, a análise proposta neste trabalho pretende não apenas esclarecer os aspectos normativos, mas também destacar as implicações práticas e estratégicas dessa ferramenta no contexto das contratações públicas.
- O Sistema de Registro de Preços (SRP)
Inicialmente, cumpre destacar que o Sistema de Registro de Preços (SRP) é uma ferramenta auxiliar utilizada para registrar valores e condições de contratação futura de bens, serviços e obras. Essa metodologia é especialmente útil em situações onde as demandas não podem ser determinadas com exatidão, possibilitando uma gestão mais eficiente e adaptável dos recursos pela administração pública. A Lei nº 14.133/2021, em seu artigo 82, trouxe avanços importantes, como a exigência de indicar no edital as quantidades máximas e mínimas a serem registradas, o que torna o processo mais claro e organizado.
A inclusão de quantidades mínimas no edital não significa que a administração pública terá a obrigação de adquirir o volume especificado, mas serve como um guia para que os licitantes possam elaborar propostas mais precisas. Isso contribui para um equilíbrio mais adequado entre oferta e demanda. Além disso, essa regra busca trazer maior previsibilidade e segurança jurídica tanto para os fornecedores quanto para a administração pública.
- A Importância Estratégica do Registro de Preços e os Impactos da Fixação de Quantitativos Mínimos nos Editais
O Sistema de Registro de Preços (SRP) ocupa um papel estratégico na administração pública, especialmente em cenários de restrição orçamentária e aumento das demandas por serviços eficientes. Sua implementação permite à gestão pública maior controle sobre os processos de aquisição, atendendo às necessidades de maneira racional e econômica.
Um dos principais benefícios do SRP é a flexibilidade que proporciona à administração, permitindo que as aquisições sejam ajustadas às demandas reais, evitando contratações desnecessárias ou excessivas. Essa característica é particularmente relevante para instituições que lidam com necessidades imprevisíveis, como hospitais, escolas e órgãos de segurança.
Além disso, o SRP possibilita a consolidação de demandas de diferentes órgãos e entidades, favorecendo a negociação de condições contratuais mais vantajosas. Por meio da aquisição de grandes volumes de bens ou serviços, torna-se viável alcançar economias de escala, com significativa redução dos custos.
Tal abordagem também contribui para a simplificação dos processos administrativos, uma vez que uma única licitação no âmbito do SRP pode subsidiar múltiplas contratações, reduzindo a burocracia e otimizando os recursos disponíveis. Essa estrutura processual não só diminui os custos operacionais como também acelera a entrega de bens e serviços à sociedade.
A Lei nº 14.133/2021, em seu artigo 82, trouxe importantes avanços para o SRP ao exigir que os editais indiquem as quantidades máximas e mínimas previstas para o registro de preços. Essa disposição normativa estabelece que o quantitativo mínimo refere-se à quantidade que os licitantes devem cotar em suas propostas, funcionando como um parâmetro para a formulação dos preços.
No entanto, essa exigência não implica obrigatoriedade de aquisição por parte da administração, que pode optar por não adquirir o quantitativo mínimo durante a vigência da ata de registro de preços. Contudo, é indispensável que a previsão contida no edital seja realista e bem fundamentada, evitando distorções que possam comprometer a eficiência do processo.
A fixação de quantitativos mínimos nos editais também traz vantagens substanciais para o processo licitatório. Ao prever uma quantidade mínima, os fornecedores obtêm maior previsibilidade em relação à demanda, o que os capacita a calcular de forma mais precisa seus custos de produção, transporte e logística, refletindo-se em propostas mais equilibradas.
Essa previsibilidade, aliada à exploração das economias de escala, favorece setores como o gráfico, alimentício e de transporte, onde volumes maiores frequentemente reduzem o custo unitário. A inclusão de tais parâmetros também tende a atrair maior competitividade entre os fornecedores, pois garante a eles maior segurança no planejamento, incentivando a apresentação de propostas mais vantajosas para a administração.
No entanto, a definição de quantitativos mínimos não está livre de desafios. A rigidez que essa prática pode impor ao atendimento das demandas é um ponto crítico, visto que a administração pode se ver obrigada a adquirir volumes superiores às suas necessidades imediatas, comprometendo a eficiência do gasto público.
Outro possível problema é o risco de calcular valores acima do necessário, o que pode levar à compra de bens ou serviços em quantidades excessivas, resultando em desperdício de recursos.
Ademais, a gestão de estoques pode ser sobrecarregada, especialmente em instituições com infraestrutura limitada, dificultando o armazenamento adequado dos itens adquiridos.
Por fim, a flexibilidade do SRP também pode ser prejudicada em contextos onde a demanda é altamente variável, uma vez que a imposição de quantitativos mínimos pode limitar a capacidade de realizar contratações pontuais e sob medida. Assim, a decisão de incluir ou não esses parâmetros no edital devem ser tomada com base em análises rigorosas e fundamentadas, considerando a natureza do objeto contratado.
Para itens cuja demanda é previsível, a fixação de quantitativos mínimos pode ser uma estratégia recomendável. No entanto, para bens ou serviços de consumo incerto, a flexibilidade deve ser priorizada.
Nesse sentido, é fundamental realizar uma análise de riscos, avaliando os possíveis impactos de subutilização dos bens adquiridos ou comprometimento orçamentário devido a previsões equivocadas.
O diálogo prévio com fornecedores também se apresenta como uma medida prudente, possibilitando ajustes mais precisos nas estimativas de demanda e na definição de quantitativos mínimos mais adequados. Com essas práticas, é possível otimizar os benefícios do SRP, garantindo contratações públicas mais eficientes, econômicas e alinhadas aos interesses da coletividade.
Nesse sentido, o Sistema de Registro de Preços (SRP) é amplamente reconhecido como uma ferramenta estratégica para a administração pública, permitindo maior eficiência nas contratações e contribuindo para a organização das aquisições.
A definição de quantitativos mínimos nos editais desempenha um papel crucial nesse processo, impactando diretamente a previsibilidade e a competitividade do mercado fornecedor. Segundo Jacoby Fernandes, “ao definir quantitativos mínimos, o edital oferece previsibilidade aos fornecedores, o que impacta positivamente na formação de preços e favorece a exploração das economias de escala, especialmente em contratos de fornecimento contínuo”[2].
Essa prática facilita o planejamento por parte dos licitantes, proporcionando condições mais favoráveis para calcular custos e oferecer propostas mais vantajosas.
Além disso, como apontado pela Zênite, “a definição de um quantitativo mínimo em editais de registro de preços proporciona aos fornecedores a confiança necessária para calcular melhor os seus custos e, consequentemente, gerar propostas mais vantajosas e competitivas”[3].
Essa previsibilidade, especialmente em contratos de fornecimento contínuo, é essencial para alinhar as expectativas da administração pública às condições de mercado, reduzindo incertezas e estimulando a competitividade.
A doutrina também destaca os benefícios dessa prática na formação de preços mais baixos. Igor Pereira Pinheiro observa que “a fixação de quantidades mínimas nos editais ajuda na formação de preços mais baixos, principalmente em contratos de fornecimento contínuo, pois estimula maior participação de fornecedores, o que favorece a competitividade”[4].
Essa abordagem, ao consolidar demandas e garantir um volume mínimo de aquisição, permite aos fornecedores ofertarem propostas mais econômicas, explorando as vantagens das economias de escala.
Dessa forma, a definição de quantitativos mínimos nos editais, quando utilizada de forma planejada e fundamentada, contribui para um ambiente concorrencial mais robusto e alinhado aos princípios de economicidade e eficiência, que regem a administração pública.
Contudo, como foi discutido ao longo do artigo, é necessário balancear cuidadosamente a definição de quantitativos, para que a flexibilidade do SRP não seja comprometida, e que o risco de superestimação não gera desperdícios desnecessários. Em última análise, a prática deve ser sempre alinhada às necessidades reais da administração, garantindo o melhor aproveitamento dos recursos públicos.
A implementação adequada do SRP contribui para o fortalecimento da governança pública, assegurando maior eficiência, transparência e economicidade nas contratações. Além disso, ao alinhar as práticas administrativas às necessidades reais, a administração pública ganha maior credibilidade junto à sociedade.
- Impactos da Previsão de Quantitativos Mínimos nos Editais de Registro de Preços
A inserção de quantitativos mínimos nos editais de registro de preços exerce uma influência significativa tanto na administração pública quanto nos fornecedores, trazendo benefícios e desafios que exigem uma análise criteriosa. Essa prática proporciona maior previsibilidade aos licitantes, permitindo que planejem suas operações de maneira mais eficiente, o que se reflete em propostas mais competitivas e ajustadas às demandas da administração.
Destarte, ao estabelecer um volume mínimo, há a oportunidade de aproveitar economias de escala, resultando em condições comerciais mais vantajosas e custos reduzidos.
Outro aspecto positivo é a diminuição de incertezas e a simplificação dos processos contratuais. A previsão de uma base mínima de aquisição traz maior clareza para todos os envolvidos, o que contribui para contratações mais ágeis e menos burocráticas. Essa abordagem também auxilia no planejamento financeiro da administração pública, mitigando os riscos associados a aquisições desordenadas de bens ou serviços.
Por outro lado, há dificuldades associadas à definição de quantitativos mínimos. Um desafio importante é o risco de superdimensionamento das necessidades, o que pode levar a um desperdício de recursos públicos e ao acúmulo de estoques desnecessários, em desacordo com o princípio da eficiência. Em contrapartida, estimativas muito conservadoras podem desestimular a participação de pequenos fornecedores, limitando a competitividade do processo licitatório.
Além disso, a inclusão de mínimos pode influenciar a formação de preços pelos fornecedores, que podem basear suas propostas em valores médios, sem considerar eventuais ganhos de escala em contratos de maior volume. Isso pode encarecer as aquisições públicas, contrariando os objetivos de racionalização dos gastos.
Diante disso, torna-se indispensável que a administração pública conduza estudos técnicos detalhados para determinar quantitativos mínimos adequados nos editais. Essa análise deve levar em conta as demandas reais e a capacidade do mercado de atender a essas condições. Assim, será possível alcançar um equilíbrio entre previsibilidade, eficiência e flexibilidade, promovendo processos mais transparentes, competitivos e em conformidade com o interesse público.
- CONCLUSÃO
O Sistema de Registro de Preços, conforme regulamentado pela Lei nº 14.133/2021, é uma ferramenta indispensável para a administração pública moderna. Sua flexibilidade e capacidade de adaptação às demandas reais oferecem um modelo eficiente para gestão de compras públicas. Contudo, a decisão de fixar quantidades mínimas no edital deve ser tomada com cautela, considerando os benefícios e os desafios apresentados.
Além disso, o Sistema de Registro de Preços permite à administração pública alinhar suas necessidades a um planejamento mais estratégico, promovendo maior previsibilidade tanto para os gestores quanto para os fornecedores. A possibilidade de consolidar demandas entre diferentes órgãos amplia o potencial de negociações vantajosas, mas exige que a previsão de quantitativos seja fundamentada em estudos técnicos detalhados e projeções realistas.
Por fim, a fixação de quantidades mínimas, embora não obrigatória, pode ser uma medida relevante para garantir a competitividade e atratividade das licitações, desde que seja equilibrada com a necessidade de manter a flexibilidade administrativa. Assim, é essencial que a gestão pública adote uma abordagem cautelosa e baseada em dados concretos para maximizar os benefícios e mitigar riscos no uso dessa ferramenta.
Ao equilibrar previsibilidade para fornecedores e flexibilidade para a administração, é possível maximizar os resultados, promovendo contratações mais vantajosas e alinhadas aos interesses públicos. Assim, o SRP consolida-se como uma solução estratégica para atender às crescentes demandas da sociedade com eficiência e responsabilidade.
- REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Institui a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 1º abr. 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm. Acesso em: 3 dez. 2024.
BRASIL. Tribunal de Contas da União (TCU). Acórdão nº 2.622/2013 – Plenário. Estabelece diretrizes sobre a utilização do Sistema de Registro de Preços. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br. Acesso em: 3 dez. 2024.
Decreto nº 10.024, de 20 de setembro de 2019. Regulamenta a licitação, na modalidade pregão, na forma eletrônica, para aquisição de bens e a contratação de serviços comuns, incluindo os destinados ao Sistema de Registro de Preços. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 23 set. 2019. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D10024.htm. Acesso em: 3 dez. 2024.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 35. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2023.
FERNANDES, Jacoby. Gestão de Contratos Administrativos na Nova Lei de Licitações. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2024.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 48. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2023.
PINHEIRO, Igor Pereira. Nova Lei de Licitações Anotada e Comparada. 2. ed. São Paulo: Editora Mizuno, 2023.
ZÊNITE. Artigo: “Deve constar no edital para registro de preços a quantidade mínima a ser contratada?” Zênite Blog, 2023. Disponível em: https://www.zenite.blog.br. Acesso em: 3 dez. 2024.
[1] Bacharela em Direito pela Faculdade de Rondônia (FARO), formada em 2017. Pós-graduada em Licitações e Contratos Administrativos pela Pontifícia Universidade Católica de Santa Catarina (PUC-SC) e em Direito Público pela Faculdade Legale. Possui capacitações na Lei n.º 14.133/2021. Atuou como Coordenadora de Registro de Preços da Superintendência de Licitações do Estado de Rondônia e Gerente de Compras do Conselho Regional de Engenharia do Estado de Rondônia. Atualmente é Diretora de Atos e Normas Licitatórias pelo Instituto de Previdência do Município de Porto Velho (IPAM). Advogada inscrita na OAB/RO sob o n.º 9.689.
[2] Fernandes, Jacoby. Gestão de Contratos Administrativos na Nova Lei de Licitações. Editora Fórum, 2024.
[3]Zênite. Artigo: “Deve constar no edital para registro de preços a quantidade mínima a ser contratada?” Zênite Blog, 2023. Disponível em: Zênite Blog.
[4]Pinheiro, Igor Pereira. Nova Lei de Licitações Anotada e Comparada. 2ª edição, Editora Mizuno, 2023.