As Entidades do Sistema S podem remunerar os integrantes de comissão de licitação por conta do desempenho da atividade?

O Regulamento do SENAC,[1] citado para ilustrar o que os normativos dessas entidades estabelecem ordinariamente sobre a comissão de licitação, prevê:

“Art. 4º. Para os fins deste Regulamento, considera-se:

(…)

X – COMISSÃO DE LICITAÇÃO – colegiado, permanente ou especial, composto por pelo menos 3 (três) integrantes, formalmente designado para praticar os atos necessários ao processamento da licitação;

(…)

Art. 26. A licitação deve ser afeta a um leiloeiro, pregoeiro ou uma comissão de licitação, observando-se, no que couber, as seguintes fases:”

Do teor da norma depreende-se, então, que a comissão de licitação é o colegiado composto por pelo menos 03 (três) membros[2] que tem por finalidade processar as licitações que as entidades realizam, atividade esse que envolve, como regra, os atos relativos à fase externa do certame, especialmente os de receber, examinar e julgar propostas/lance e documentos apresentados à vista das exigências e critérios objetivos previamente definidos no instrumento convocatório, sendo responsável, consequentemente, pelos atos e decisões que realizar no desempenho desse mister.

E, é ressabido que os agentes designados como integrantes da comissão de licitação normalmente acumulam o desenvolvimento desses trabalhos com o desempenho de suas atividades corriqueiras, isso é, aquelas para as quais foram contratados.

Assim é que, ao mesmo tempo em que realizamas atividades afetas ao cargo que ocupam, executam, em acréscimo, os trabalhos necessários ao correto desenrolar dos certames licitatórios que as entidades têm a obrigatoriedade de instaurar para formalizar suas contratações, o que acaba por resultar em um acúmulo de funções.

Isso porque, conforme bem observa Marçal Justen Filho, “Não existe a previsão de cargo ou emprego público destinado ao exercício específico da função de órgão da contratação”, terminologia que usa para se referir aqueles que são investidos da competência de processar a licitação.

Por conseguinte, e considerado, ademais, que o processamento das licitações demanda horas de trabalhos – sem falar nos estudos e aperfeiçoamentos imprescindíveis para se obter a aptidão necessária – e envolve responsabilidade por cada decisão tomada no curso dessas, entende-se justo que os agentes que integram a comissão de licitação percebam alguma gratificação pela atividade efetivamente desempenhada.

A doutrina corrobora:

GRATIFICAÇÃO DE SERVIÇO (PROPTER LABOREM). COMISSÃO DE LICITAÇÃO. Desde que vigente lei local prevendo a atribuição de gratificação aos membros do colegiado, possível posto que corresponde ao exercício de atividade estranha ao elenco das atribuições normais de seus cargos ou funções, e estando determinado servidor público ocupante de cargo de provimento em comissão designado para integrá-la (e portanto, atendidos todos os requisitos legais aplicáveis, inclusive aqueles fixados no art. 51 da Lei federal nº 8.666/93), nada obsta que lhe seja atribuída a gratificação.”[3] (grifou-se)

“A concessão de gratificação a comissão de licitação é legal?

A concessão de gratificação a comissão de licitação é legal, desde que as funções dos integrantes da Comissão Permanente de Licitação – CPL, sejam acumuladas com as do cargo original. Ou seja, o funcionário designado para a CPL não deixa de cumprir as responsabilidades do cargo original.

Desse modo, em razão dessa atribuição adicional, alguns municípios pagam uma gratificação extra para os servidores efetivos que exerçam cumulativamente as funções do cargo com as de membro de comissão de licitação.

Qual o entendimento dos Tribunais de Contas sobre o tema?

Este procedimento é permitido pelos Tribunais de Contas, porém deve existir previsão legal para o pagamento. O Tribunal de Contas do Estado do Paraná – TCE/PR inclusive entende que o recebimento desta gratificação não impede que o servidor perceba outra de natureza diversa.

Nos casos em que as atribuições da comissão de licitação forem passageiras ou demandem pequeno tempo, pode-se pagar jetom por sessão ao invés da gratificação mensal fixa, desde que o valor previsto seja proporcional ao tempo despendido pelo servidor na função extra.

Já o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – TCE/MG, ao responder consulta sobre o tema, dentre outros aspectos, declarou que, apesar da Lei Nacional n.º 8.666/1993, da Lei Nacional n.º 10.520/2002 e da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei Nacional n.º 14.133/2021) não regulamentarem o pagamento de verba adicional aos membros da CPL, não há impedimentos para a percepção de gratificação, por servidores ocupantes exclusivamente de cargo em comissão, em razão da participação em comissão de licitação ou em equipe de apoio, devendo a entidade licitante fundamentar-se em lei local já existente que discipline o regime jurídico do servidor público e que preveja a concessão de tal gratificação ou mesmo criar lei específica disciplinando o assunto.

Por fim, o Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo – TCE/ES, além de entender que a comissão de licitação pode receber gratificação, considerou regular que esta verba integre o cômputo do décimo terceiro salário. De acordo com a Corte de Contas estadual, “em decorrência do décimo terceiro salário ser pago com base em remuneração, esta constituída do vencimento e das vantagens pecuniárias percebida pelo servidor no mês de pagamento, deverá ser observado o que dispuser o Estatuto dos Servidores Públicos Municipais sobre a remuneração. Se este estabelecer que remuneração integra vantagens pecuniárias, conclui-se que a gratificação recebida pelos membros da Comissão Permanente de Licitações (autorizada por lei) inclui no cômputo do pagamento do décimo terceiro salário. Se dispuser que somente compreende as vantagens pecuniárias permanentes (adicionais), não será computada tal gratificação, por ser uma vantagem transitória”.

Conclusão

Diante de todo o exposto, percebe-se que, a despeito da omissão da legislação geral que regulamenta as aquisições públicas, os municípios podem instituir gratificação para os servidores que acumulam as funções do cargo com as atribuições da comissão permanente de licitação.”[4]

E igual raciocínio cabe acerca do pregoeiro e do leiloeiro administrativo no que tange a condução dos certames licitatórios que lhes são designados, na medida que esses igualmente têm seu tempo de trabalho dedicado tanto as ações necessárias ao processamos de licitações quanto às suas funções habituais.

Viável, portanto, mesmo que os Regulamentos de Licitações e Contratos das entidades nada mencione, que essas venham a instituir por intermédio de normativo próprio uma gratificação para aqueles ao qual é atribuída a atividade de processar os certames licitatórios, até porque se trata de questão afeta a organização interna delas.

Mas, compete as entidades realizar os estudos e as pesquisas necessárias para definir um valor apropriado, sendo relevante salientar, contudo, que se entende que o pagamento deve restar atrelado ao efetivo desempenho das atividades, não bastando a mera designação como integrante da comissão de licitação, por exemplo, e, ainda, que a gratificação é um plus, o que significa que fazem jus a ela (gratificação/remuneração adicional) aqueles que somam às suas funções originais o desempenho dessa atividade em decorrência da designação feita.


[1] O Regulamento das demais entidades não contém previsão que altere o raciocínio.

[2] Nomeados, dentre os profissionais devidamente qualificados e pertencentes aos quadros da entidade, por intermédio de ato específico (Portaria).

[3] TAMBELLINI, Guilherme Luis da Silva. Membros de comissão de licitação podem receber gratificação. Disponível em: <http://jus.com.br/pareceres/23244/membros-de-comissao-de-licitacao-podem-receber-gratificacao>.

[4] DA FONSECA, Ricardo, https://cr2.co/concessao-de-gratificacao-a-comissao-de-licitacao/

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