Ano passado, conforme comentamos neste post, foi inserida no Regulamento de Licitações e Contratos do Sistema SEBRAE mais uma hipótese de dispensa de licitação, que se refere à possibilidade de contratação direta de encomendas tecnológicas.
E como alertamos, em consonância ao que sinaliza o TCU, as Entidades do Sistema “S” não podem inovar na ordem jurídica através de seus regulamentos, criando novas hipóteses de contratações diretas sem correspondência com as previstas em normas gerais editadas pela União (já que, nos termos da Constituição Federal, a União é quem detém competência para editar normas gerais sobre licitações e contratos). Assim sendo, tal hipótese de dispensa de licitação inserida no Regulamento do SEBRAE deve ser interpretada de acordo com previsão correspondente e já constante na Lei Geral de Licitações, bem como deve observar o que prevê a legislação específica incidente sobre o objeto, no caso a Lei nº 10.973/2004 – alterada pela Lei nº 13.243/2016 (conhecida como o Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação)e regulamentada pelo Decreto nº 9.283/2018 – a qual tem por objetivo o “incentivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas à capacitação tecnológica, ao alcance da autonomia tecnológica e ao desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional do País, nos termos dos arts. 23, 24, 167, 200, 213, 218, 219 e 219-A da Constituição Federal. (Redação pela Lei nº 13.243, de 2016)”, utilizando para tanto o “poder de compra do Estado para fomento à inovação” (art. 1º, XIII).
O referido Decreto Federal traz toda a regulamentação da contratação direta de encomendas tecnológicas, sendo bastante recomendável que sua redação seja utilizada como parâmetro para que a entidade edite norma específica para regulamentar o tema internamente.
Mas em resumo, com base na normativa federal, podemos aqui traçar alguns pontos a serem observados nesse processo de contratação direta:
i) descrição do objeto (art. 27, § 3º), que deve ser feita de modo a permitir que os interessados identifiquem a natureza do problema técnico existente e a visão global do produto, do serviço ou do processo inovador passível de obtenção, dispensadas as especificações técnicas do objeto devido à complexidade da atividade de pesquisa, desenvolvimento e inovação ou por envolver soluções inovadoras não disponíveis no mercado. Lembrando que, em nosso entender, as encomendas tecnológicas contratadas pelo SEBRAE devem ser direcionadas ao fomento do setor-alvo da entidade, qual seja o das microempresas e das empresas de pequeno porte, a fim de se harmonizar com os fins institucionais da Entidade, nos termos do que dispõe o Decreto 99.570/1990.
ii) consulta a potenciais fornecedores (art. 27, § 4º), para a obtenção de informações necessárias à definição da encomenda, cabendo à própria Entidade definir a necessidade e a forma da consulta, sendo que estas consultas não poderão implicar em desembolso de recursos por parte da entidade e tampouco preferência na escolha do fornecedor ou do executante. Ademais, as consultas e as respostas dos potenciais contratados, quando feitas formalmente, deverão ser anexadas aos autos do processo de contratação, ressalvadas eventuais informações de natureza industrial, tecnológica ou comercial que devam ser mantidas sob sigilo. E aqui entendemos ser recomendável que a Entidade realize uma chamada ou chamamento público, como forma de prospecção de mercado e para dispensar tratamento isonômico a todos os interessados.
iii) negociação das condições do contrato de encomenda tecnológica com os potenciais interessados (art. 27, § 8º), observando-se que tal negociação deve ser transparente, com documentação pertinente anexada aos autos do processo de contratação, ressalvadas eventuais informações de natureza industrial, tecnológica ou comercial que devam ser mantidas sob sigilo.
iv) escolha do contratado (art. 27, § 8º, II), que será orientada para a maior probabilidade de alcance do resultado pretendido pelo contratante, e não necessariamente para o menor preço ou custo, e a entidade poderá utilizar, como fatores de escolha, a competência técnica, a capacidade de gestão, as experiências anteriores, a qualidade do projeto apresentado e outros critérios significativos de avaliação do contratado.
v) celebração do contrato de encomenda tecnológica (art. 27, § 9º), condicionada à aprovação prévia de projeto específico, com etapas de execução do contrato estabelecidas em cronograma físico-financeiro, a ser elaborado pelo contratado, com observância aos objetivos a serem atingidos e aos requisitos que permitam a aplicação dos métodos e dos meios indispensáveis à verificação do andamento do projeto em cada etapa, além de outros elementos estabelecidos pelo contratante.
O Decreto ainda prevê, em seu art. 27, § 5º, a criação de comitê técnico de especialistas para assessorar a instituição na contratação da encomenda. No entanto, tal comitê não é obrigatório, cabendo à própria Entidade avaliar, frente ao objeto de que necessita, se há em sua estrutura equipe técnica habilitada e capacitada para realizar as atividades necessárias para viabilizar a contratação da encomenda tecnológica. Sendo necessária a criação do comitê técnico, cabe à autoridade máxima da entidade emitir ato específico, designando seus membros que auxiliará a contratante na escolha do futuro contratado, no monitoramento da execução contratual e nas demais funções pertinentes, observando-se que: I – os membros do comitê técnico deverão assinar declaração de que não possuem conflito de interesse na realização da atividade de assessoria técnica ao contratante; e, se viável em face do objeto e do mercado II – a participação no comitê técnico não será remunerada. Em relação a este último critério, aplicável no âmbito da Administração Pública, cabe ao SEBRAE, frente ao mercado, verificar a existência de profissionais que se disponham à prestação do serviço sem remuneração, o que não sendo viável, deve restar justificado no processo.