DECRETO 10.024/2019 – NOVO REGULAMENTO DO PREGÃO ELETRÔNICO

Há tempos aguardado pela doutrina e profissionais que atuam no dia a dia das licitações, enfim, em 23 de setembro de 2019, foi publicado o Decreto nº. 10.024, que regulamenta o pregão eletrônico e o uso da dispensa eletrônica no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.

Já no art. 1º, § 1º, o Decreto prescreve a obrigatoriedade do pregão eletrônico para bens e serviços comuns, excepcionando-o, porém, mediante prévia justificativa da autoridade competente, desde que comprovada a inviabilidade técnica ou a desvantagem para a administração, hipótese em que se cogita a adoção do formato presencial (§ 4º, do art. 1º).

O normativo aplica-se, também, aos entes federativos que contratem bens e serviços comuns com recursos da União repassados por transferências voluntárias, tais como convênios e contratos de repasse, sendo obrigatório o pregão eletrônico, salvo se a Lei ou regulamentação específica que dispuser sobre aludida transferência definir de forma diversa (art. 1º, § 3º).

Pode incidir, ainda, no âmbito das empresas públicas e sociedades de economia mista, conforme definido no Regulamento de Licitações e Contratos, editado com supedâneo no art. 40, da Lei 13.303/16, naquilo em que não conflitar com a referida Lei (art. 1º, § 2º).

Com efeito, rememora-se que o art. 32, inciso IV, da Lei 13.303/16, estabelece como diretriz da licitação a preferência pela modalidade pregão, para bens e serviços comuns, nos termos da Lei 10.520/02. E, para cumprir com tal dispositivo legal, é que o Decreto contempla a possibilidade de cada estatal definir em norma interna a adoção do pregão eletrônico. Não obstante, conforme já nos manifestamos em outros artigos, causa espanto a Lei das Estatais, que não estabelece mais modalidade de licitação, mas sim modos de disputa (aberto e fechado) prescrever a preferência à modalidade pregão. Em nosso entender, mais correto seria estabelecer a preferência pelo modo de disputa aberto e não, propriamente, à modalidade pregão. De qualquer sorte, o Decreto, a exemplo do que consta na Lei 13,303/16, também trouxe a aplicabilidade ao pregão eletrônico dos modos de disputa aberto e aberto e fechado, estando mais próximo ao procedimento traçado na Lei 13.303/16.

Em relação ao conceito de bens e serviços comuns, manteve-se a lógica da Lei 10.520/02, como não poderia ser diferente: “bens cujo padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações reconhecidas e usuais no mercado” (art. 3º, II). Mas o regulamento foi além, afastando do conceito de comum bens e serviços que possuem alta heterogeneidade ou complexidade técnica, o que, a bem da verdade, já era reconhecido pela doutrina. Ademais, o Decreto alerta que a classificação de um bem ou serviço como comum depende de exame fático e de natureza técnica (art. 3º, §1º), o que exige, portanto, acurada pesquisa de mercado. Mais uma vez, não representa grandes novidades, porquanto esta já era a orientação do TCU. Por outro lado, deixou clara a viabilidade do pregão eletrônico para bens e serviços de natureza intelectual, científica e técnica que possam ser definidos de acordo com os padrões usuais de mercado (art. 3º, § 2º). Trouxe, portanto, um norte ao intérprete, que sempre se via diante da celeuma em utilizar ou não pregão para serviços intelectuais. A questão, mais uma vez, requer consulta ao mercado com o escopo de aferir especificações usuais e padronizadas.

O art. 1º do recente Decreto corrobora a tese há muito defendida pelo TCU (Súmula 257) acerca da adoção do pregão para serviços comuns de engenharia, deixando assente também a sua inaplicabilidade para obras, locações imobiliárias, alienações e bens e serviços especiais, incluído os serviços de engenharia enquadrados no inciso III, do art. 3º (art. 4º).

O art. 6º inova no processamento desta modalidade ao estabelecer que os documentos de habilitação devem ser apresentados juntamente com as propostas. À primeira vista, a questão pode aparentar ilegalidade em face do procedimento previsto na Lei 10.520/02, que definiu fases distintas e independentes. Não obstante, compulsando-se a norma com mais cautela, infere-se que embora os licitantes devam enviar a documentação pelo sistema quando do cadastramento das propostas, a documentação somente ficará acessível ao pregoeiro após a etapa de lances (art. 26, § 8º), respeitando-se, em nosso entender, a sistemática da Lei 10.520/02.

O normativo ainda contempla a realização do estudo técnico preliminar, sempre que necessário, ferramenta que contribui para o correto planejamento da contratação e para a descrição do objeto à luz das especificações do mercado. Conforme art. 3º, inciso IV, este consiste num “documento constitutivo da primeira etapa do planejamento de uma contratação que caracteriza o interesse público envolvido e a melhor solução ao problema a ser resolvido e que, na hipótese de conclusão pela viabilidade da contratação, fundamenta o termo de referência”.

Seguindo a lógica do art. 34, da Lei 13.303/16, o art. 15 do Decreto estabelece o sigilo do valor estimado ou máximo, caso não conste expressamente no edital. Porém, ainda que sigiloso, deve permanecer disponível aos órgãos de controle interno e externo. Mas, diferente da Lei 13.303/16, que foi silente sobre o assunto, o Decreto definiu o momento de divulgação do referido valor, “apenas e imediatamente após o encerramento do envio dos lances” (art. 15, § 2º).

O art. 20, por seu turno, segue a recente alteração promovida no art. 21, da Lei 8.666/93, pela Medida Provisória 896, pertinente à dispensa de publicação do aviso do edital em jornal de grande circulação, exigindo apenas a veiculação em Diário Oficial e no sítio eletrônico oficial do órgão ou entidade promotora da licitação.

Agora, substancial alteração se verifica no processamento da fase de lances, que poderá adotar os modos de disputa aberto, bem como a combinação do aberto com o fechado. Conforme art. 31, no primeiro “os licitantes apresentarão lances públicos e sucessivos, com prorrogações, conforme o critério de julgamento adotado no edital”. Já no aberto e fechado “os licitantes apresentarão lances públicos e sucessivos, com lance final e fechado, conforme o critério de julgamento adotado no edital”. No modo de disputa aberto, o edital preverá intervalo mínimo de diferença de valores ou de percentuais entre os lances que incidirá em relação aos lances intermediários e para cobrir a melhor oferta (parágrafo único, art. 31).

Os arts. 32 e 33 definem o processamento dos modos de disputa:

Modo de disputa aberto

Art. 32.  No modo de disputa aberto, de que trata o inciso I do caput do art. 31, a etapa de envio de lances na sessão pública durará dez minutos e, após isso, será prorrogada automaticamente pelo sistema quando houver lance ofertado nos últimos dois minutos do período de duração da sessão pública.
§ 1º A prorrogação automática da etapa de envio de lances, de que trata o caput, será de dois minutos e ocorrerá sucessivamente sempre que houver lances enviados nesse período de prorrogação, inclusive quando se tratar de lances intermediários.
§ 2º Na hipótese de não haver novos lances na forma estabelecida no caput e no § 1º, a sessão pública será encerrada automaticamente.
§ 3º Encerrada a sessão pública sem prorrogação automática pelo sistema, nos termos do disposto no § 1º, o pregoeiro poderá, assessorado pela equipe de apoio, admitir o reinício da etapa de envio de lances, em prol da consecução do melhor preço disposto no parágrafo único do art. 7º, mediante justificativa.

Modo de disputa aberto e fechado

Art. 33.  No modo de disputa aberto e fechado, de que trata o inciso II do caput do art. 31, a etapa de envio de lances da sessão pública terá duração de quinze minutos.
§ 1º Encerrado o prazo previsto no caput, o sistema encaminhará o aviso de fechamento iminente dos lances e, transcorrido o período de até dez minutos, aleatoriamente determinado, a recepção de lances será automaticamente encerrada.
§ 2º Encerrado o prazo de que trata o § 1º, o sistema abrirá a oportunidade para que o autor da oferta de valor mais baixo e os autores das ofertas com valores até dez por cento superiores àquela possam ofertar um lance final e fechado em até cinco minutos, que será sigiloso até o encerramento deste prazo.
§ 3º Na ausência de, no mínimo, três ofertas nas condições de que trata o § 2º, os autores dos melhores lances subsequentes, na ordem de classificação, até o máximo de três, poderão oferecer um lance final e fechado em até cinco minutos, que será sigiloso até o encerramento do prazo.
§ 4º Encerrados os prazos estabelecidos nos § 2º e § 3º, o sistema ordenará os lances em ordem crescente de vantajosidade.
§ 5º  Na ausência de lance final e fechado classificado nos termos dos § 2º e § 3º, haverá o reinício da etapa fechada para que os demais licitantes, até o máximo de três, na ordem de classificação, possam ofertar um lance final e fechado em até cinco minutos, que será sigiloso até o encerramento deste prazo, observado, após esta etapa, o disposto no § 4º.
§ 6º Na hipótese de não haver licitante classificado na etapa de lance fechado que atenda às exigências para habilitação, o pregoeiro poderá, auxiliado pela equipe de apoio, mediante justificativa, admitir o reinício da etapa fechada, nos termos do disposto no § 5º”.

Nos termos do art. 32, no modo de disputa aberto a fase de lances terá duração inicialmente de 10 minutos. Caso seja oferecido lance nos últimos 02 (dois) minutos, o tempo será prorrogado por mais 02 (dois) minutos e assim sucessivamente, sempre que um novo lance seja ofertado nesse intervalo de tempo.

Essa mudança é substancial e tende a conferir maior vantagem à Administração Pública. Com efeito, no procedimento descrito no Decreto 5.450/05, a fase de lances é encerrada pelo tempo randômico, prazo aleatório de até 30 (trinta) minutos. Sendo aleatoriamente definido pelo sistema, não raro a etapa de lances se encerra em frações de segundos, quando ainda eventuais licitantes têm interesse em cobrir o menor preço, sem qualquer vantagem competitiva à Administração Pública. Ou seja, muitas vezes a seleção do vencedor ocorre por pura sorte. Com as alterações promovidas pelo Decreto 10.024/19, a cada novo lance o sistema prorroga o prazo, viabilizando que os licitantes cubram a oferta, o que garante maior competitividade e economicidade.

Já no modo de disputa aberto e fechado, nos termos do art. 33, o prazo inicial da etapa de lances é de 15 (quinze) minutos, seguido de tempo aleatório (randômico) de até 10 (dez) minutos, sem qualquer prorrogação. Encerrado o tempo randômico, os licitantes que apresentaram valores até 10% (dez por cento) acima do menor terão nova oportunidade de oferecer proposta fechada, no prazo de até 05 (cinco) minutos. Caso não haja o mínimo de três propostas no percentual de 10%, serão selecionadas as três melhores. Após esse lapso temporal de cinco minutos, o sistema divulga as propostas finais. Mais uma vez, além de contribuir para a seleção do fornecedor de forma mais justa, minimiza o risco de robôs (envio automático de lances).

Em breve análise, estas são nossas impressões preliminares do novel decreto, sem a pretensão de uma análise exaustiva por ser a matéria recente.

Por derradeiro, importa frisar que o decreto entrará em vigor em 28 de outubro de 2019. Os editais publicados após esta data devem seguir o novo procedimento, ao passo que os instrumentos veiculados até o dia 28 permanecem regidos pelo Decreto 5.450/05.

E, você, o que achou das alterações?

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