Os Serviços Sociais Autônomos têm personalidade de direito privado, e atuam aolado do Estado, mediante o desempenho de atividades não lucrativas. Não obstante a isso, importa frisar que não integram a Administração Pública direta (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), tampouco a indireta (Autarquias, Fundações Públicas, Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas).[1]–[2]
Embora não se confundam com o Poder Público, por administrarem contribuições parafiscais e desempenharem atividade de relevante interesse público, em prol das categorias profissionais que representam, as Entidades devem seguir um procedimento prévio às contratações, regra geral por meio de licitação, e submetem-se à rigorosa fiscalização do Tribunal de Contas da União[3].
No âmbito da Administração Pública, o dever de licitar está previsto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, e regulamentado na Lei nº. 8.666/93, que fixa as normas gerais de licitações e contratos. Porém, embora os Serviços Sociais Autônomos estejam obrigados a licitar, não se submetem, à Lei nº. 8.666/93, na medida em que o art. 1º da referida norma não contemplou tais Entidades como destinatárias. Em virtude disso, e, por entender o peculiar regime jurídico de direito privado do Serviço Social Autônomo, que difere do aplicável à Administração Pública, o próprio Tribunal de Contas da União reconheceu em 1997, por meio da Decisão 907, que cada Serviço Social Autônomo poderia criar regulamentos próprios sobre licitações e contratos, mais simplificados do que a Lei nº. 8.666/93, desde que respeitados certos princípios.
Dessa forma, as contratações das Entidades devem seguir o Regulamento próprio de Licitações e Contratos, que no art. 1º contempla, como regra, o dever de licitar para contratações de obras, serviços, compras e alienações, ressalvadas as contratações diretas elencadas nos arts.9º (dispensa) e 10 (inexigibilidade).
Sabe-se que o Tribunal de Contas da União, em alguns julgados, recomenda a aplicação subsidiária da Lei 8.666/93 aos Serviços Socias Autônomos, na hipótese de omissão do regulamento ou dispositivo deste contrário aos princípios e normas gerais, a exemplo do decidido no Acórdão 3454/2007 – Primeira Câmara:
“A exigência de que o Estatuto das Licitações e Contratos seja observado por entidades do Sistema ‘S’ pode ser justificada em duas hipóteses: ausência de regra específica no regulamento próprio da entidade ou dispositivo, do mesmo regulamento, que contrarie os princípios gerais da Administração Pública e os específicos relativos às licitações e os que norteiam a execução da despesa pública”.
Já de plano, é preciso reconhecer que o TCU cogita a aplicação subsidiária da Lei 8.666/93 apenas diante da omissão do Regulamento ou dispositivo deste que contrarie os princípios e as normas gerais, assim, na hipótese de dispensa de licitação não há que se falar em omissão do Regulamento, ao contrário, essa norma definiu as hipóteses de dispensa de licitação em seu art. 9º, mas de forma diversa da prevista na Lei Geral de Licitações. Portanto, não há que se falar em omissão, o que o Regulamento fez foi prescrever de forma diferente as situações de dispensa[4], não sendo viável, em nosso entender, a aplicação subsidiária.
Inclusive, a própria aplicação subsidiária da Lei 8.666/93 é combatida pelos Serviços Sociais Autônomos e refutada pelo Supremo Tribunal Federal, consoante ilustra o seguinte julgado:
“Feitas essas considerações, conclui-se que as entidades do “Sistema S” desenvolvem atividades privadas incentivadas e fomentadas pelo Poder Público, não se submetendo ao regramento disciplinado pela Lei 8.666/93. Tendo em vista a autonomia que lhes é conferida, exige-se apenas a realização de um procedimento simplificado de licitação previsto em regulamento próprio, o qual deve observar os princípios gerais que regem a matéria. No caso dos autos, verifica-se que o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) possui regulamento próprio sobre licitações (Resolução 25/2012), do qual não consta a exigência de que em seus editais deva conter o orçamento estimado em planilhas de quantitativos e custos unitários, bem como de critério de aceitabilidade”. (STF. MS nº. 33.442/DF, Julgado em 27/03/2018).
Conforme se extrai desse julgado, verifica-se que as próprias Entidades se insurgem com frequência contra a aplicação subsidiária da Lei, razão pela qual, por questão de coerência, não se entende razoável defender a adoção da Norma Geral de Licitações apenas quando ela é favorável.