A edição da Lei nº 13.303/2016 derivou da delegação constitucional do art. 173 à lei ordinária para o estabelecimento do estatuto jurídico das estatais, devendo dispor sobre a função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade, a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal e sobre os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.
Com efeito, a Lei atendeu todos os elementos designados pela Constituição Federal, criando órgãos e critérios para seu funcionamento, impondo capacidades técnicas para posse em cargos, além de instituir um regime próprio de licitações e contratos às empresas estatais.
A Lei nº 13.303 completou, em 30 de junho de 2019, três anos de publicação e um ano de plena vigência, tendo muito o que comemorar pela instituição de um novo regime jurídico para as empresas públicas e sociedades de economia mista.
Podendo ser dividida em grandes grupos (governança, licitações e contratos) destacamos um ponto relevante de cada temática para celebrar a Lei, legislação vanguardista, mas que, acima de tudo, tem como objetivo a efetiva prestação de serviços, através de uma gestão mais profissional das empresas estatais, com pleno atendimento de sua função social, mediante o uso eficiente dos recursos públicos disponíveis.
1. Os requisitos para ser administrador
Historicamente, as estatais suportam a interferência política na indicação de pessoas sem qualificação ou formação técnica para cargos da alta direção, servindo como barganha ou moeda de troca para a governabilidade do presidencialismo de coalizão existente no país.
A Lei das Estatais, atenta a essa ingerência, previu no art. 17 os requisitos para nomeação como Diretor ou membro do Conselho de Administração, dentre os quais, destacamos: experiencia profissional mínima e a formação acadêmica compatível com o cargo para o qual foi indicado, frisando, ainda, a vedação de indicação de pessoa que tenha ou possa ter qualquer forma de conflito de interesse com a entidade.
Parecem previsões lógicas, e de fato são, mas a verdade é que por muito tempo a indicação era meramente política, onde o indicado era desprovido de qualquer capacidade técnica e/ou gerencial, indicações, muitas vezes, permeadas de interesses pessoais diretos ou transversais na atuação, enquanto representante da estatal.
Hoje os todos requisitos e impedimentos são checados previamente pelo Comitê de Elegibilidade antes da nomeação, estrutura de governança criada pelo Decreto nº 8.945/16, regulamentor da Lei das Estatais, e que, dentro de sua competência, deverá opinar sobre a indicação no prazo de 8 dias úteis, contado da data de recebimento do formulário, sob pena de aprovação tácita e responsabilização dos seus membros caso se comprove o descumprimento de algum requisito.
Embora o Comitê de Elegibilidade seja uma estrutura apenas consultiva, há que se considerar que não soará muito adequada a nomeação de um indicado que tenha recebido um parecer negativo por ausência dos requisitos que a Lei instituiu como compulsórios.
2. A contratação semi-integrada
Uma das grandes inovações da Lei das Estatais, em matéria de licitação, foi a instituição da contratação semi-integrada, regime de execução ausente nas demais legislações licitatórias, como Lei nº 8.666/1993 e Lei nº 12.462/2011.
Esse modelo será utilizado quando for possível definir previamente no projeto básico as quantidades dos serviços a serem posteriormente executados na fase contratual, em obra ou serviço de engenharia que possa ser executado com diferentes metodologias ou tecnologias, envolvendo, a contratação, a elaboração e o desenvolvimento do projeto executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, nos termos do art. 43 e art. 42, ambos inciso V, respectivamente.
A elaboração do projeto básico deve ser precedida da licitação, porém, na contratação semi-integrada, a contratada poderá fazer alterações no projeto básico existente, visando inovação em soluções metodológicas ou tecnológicas, definições que deverão constar, obrigatoriamente, na matriz de riscos (elemento indispensável nos contratos decorrentes da contratação semi-integrada, sendo a cláusula definidora de riscos e responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, de acordo com o art. 42, X).
A possibilidade de alteração do projeto básico necessita de demonstração que as inovações sugeridas importem redução de custos, aumento da qualidade, redução do prazo de execução e facilidade de manutenção ou operação.
É, de fato, uma inovação para a Administração e para o mercado, que tem motivação para apresentar um trabalho mais eficiente e com soluções modernas aptas ao melhor atendimento do interesse público, onde a disputa poderá pautar-se pela melhor e mais recente técnica ou método, e não mais somente pelo preço.
3. Alterações contratuais CONSENSUAIS
Uma grande sutileza, mas que faz toda a diferença para uma relação salutar entre contratante e contratado, foi a bilateralidade trazida pela Lei das Estatais quando da celebração de termos aditivos de valor.
No regime da Lei nº 8.666/93, o contratado é obrigado a aceitar acréscimos e supressões que interessarem unilateralmente à Administração, o que implica, muitas vezes, em onerosidade para o contratado, repercutindo em abandono do contrato, má prestação dos serviços, entre outros vícios e prejuízos à estatal contratante.
O art. 81, §1º da Lei das Estatais tem redação quase que copiada da Lei nº 8.666, com a alteração relevante especialmente para o contratado, que não mais é obrigado a aceitar o aumento ou a diminuição dos quantitativos, o contratado agora poderá ou não aceitar a alteração da planilha. Será, portanto, uma alteração consensual de quantitativos.
Com certeza foi um grande avanço em termos contratuais, colocando as partes em pé de igualdade para negociar um contrato que é, desde sua gênese, instrumento bilateral, abandonando a alteração unilateral do regime geral.
Essa garantia de participar da construção da alteração quantitativa, podendo propor alternativas ou não aceitar as condições apresentadas, introduz a possibilidade de diálogo entre as partes, onde, à mesa, poderão acordar as novas condições, o que traz, por conseguinte, segurança ao contratado e ao interesse público, diminuindo a possibilidade de ter um contrato interrompido, não cumprido ou mal executado.
Evidentemente ainda é cedo para afirmar que a Lei das Estatais atingirá seu fim de mitigar, quiçá acabar, com casos de má gestão e abuso de toda ordem nas entidades da administração indireta, mas é inegável admitir que sua edição foi um passo relevante de combate à corrupção, buscando maior probidade dos atos administrativos praticados pelas empresas estatais, bem como dotando as empresas públicas e as sociedades de economia mista de mecanismos de eficiência e efetividade no desenvolvimento de políticas públicas de Estado, e não de governo, de maneira que cumpra sua função social, já que a razão de existir de uma empresa estatal é o cumprimento dos fins de interesse público.