Em 01 de julho de 2016 foi publicada no Diário Oficial da União a Lei nº. 13.303/2016, regulamentando o Estatuto jurídico das empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias no âmbito da União, Estados, Municípios e Distrito Federal, conhecida como “Lei das Estatais”.
Compulsando-se a norma, infere-se que ela trouxe alterações significativas no regime jurídico aplicável às estatais, mormente no que diz respeito às contratações públicas, exigindo a adequação dos processos e a capacitação dos profissionais responsáveis pelas contratações no âmbito das estatais.
Questão que surge é a seguinte: a partir de qual data as estatais estão obrigadas a adotarem os procedimentos definidos na nova lei? A Lei estabeleceu uma vacacio legis, ou seja, prazo para que a norma entre em vigor?
Esse questionamento decorre da redação do art. 91, § 3º, da referida lei:
“Art. 91. A empresa pública e a sociedade de economia mista constituídas anteriormente à vigência desta Lei deverão, no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, promover as adaptações necessárias à adequação ao disposto nesta Lei.
(…)
§ 3o Permanecem regidos pela legislação anterior procedimentos licitatórios e contratos iniciados ou celebrados até o final do prazo previsto no caput”.
Por outro lado, o art. 97 foi enfático ao estabelecer que a Lei “entra em vigor na data de sua publicação”.
Da leitura dos dispositivos em voga é possível extrair algumas interpretações:
a) As licitações instauradas e os contratos celebrados até 24 meses após a publicação da Lei (o que ocorreu em 01 de julho de 2016) submetem-se à legislação anterior, ou seja, as normas adotadas pelas estatais antes do advento da Lei 13.303/2016;
Essa foi a manifestação do Ministro do Tribunal de Contas da União, Vital do Rêgo, em comunicado específico sobre a Lei das Estatais:
“Por derradeiro, no que concerne ao direito intertemporal, cabe destacar que a Lei 13.303/2016 dispõe que permanecem regidos pela legislação anterior os procedimentos licitatórios e os contratos iniciados ou celebrados até o final do prazo de vinte e quatro meses contados do início da vigência do novo marco regulatório”.
b) A Lei entrou em vigor na data da sua publicação, nos termos do art. 97, antes reproduzido, de sorte que as licitações instauradas a partir de 01 de julho já devem seguir os procedimentos definidos na nova Lei. Nessa segunda interpretação, tem-se que as licitações e os contratos formalizados anteriormente ao advento da Lei submetem-se à legislação anterior no prazo máximo de até 24 meses, ou seja, o intuito da norma foi regulamentar as regras aplicáveis às licitações e contratos em curso.
c) Na sessão plenária do dia 6 de julho, o Ministro Vital do Rêgo fez comunicação na qual enumerou vários avanços promovidos pela nova Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016), sendo que na mesma sessão o Ministro Benjamin Zymler defendeu uma interpretação interessante acerca da aplicabilidade do novo regime jurídico. Com efeito, em vídeo divulgado no site do TCU, o aludido Ministro destaca que, em que pese o art. 91, § 3º, ter estabelecido que as licitações e os contratos formalizados até 24 meses após a publicação da Lei submetam-se à legislação anterior, sendo esse prazo máximo, deve-se exigir das estatais ação pró-ativa no sentido de implementar, o quanto antes, as modificações consignadas na norma. Assim, uma vez adequadas as normas e os procedimentos internos, não há mais que se cogitar da adoção da legislação anterior. Não se julga razoável, portanto, aguardar o prazo de 24 meses para a aplicabilidade do novo estatuto no que diz respeito às licitações e os contratos.
Em face do exposto, é possível concluir que o tema é controverso e que o legislador perdeu a oportunidade de deixar clara sua real finalidade acerca da aplicabilidade imediata da norma.
Em nosso entender, a interpretação sistemática dos arts. 91 e 97 leva à conclusão de que a norma entrou em vigor na data da sua publicação e que o prazo de 24 meses tem por escopo regulamentar as licitações em curso e os contratos formalizados antes de 01 de julho. Em outras palavras, para evitar dúvidas quanto à necessidade de alterar os editais ou mesmo acerca da possibilidade de prorrogar contratos formalizados antes da publicação da Lei, o art. 91 contemplou a aplicabilidade da legislação anterior a esses processos pelo prazo de até 24 meses. Porém, as contratações iniciadas após 01 de julho de 2016 deverão seguir os procedimentos definidos na Lei 13.303/2016. Não se pode desconsiderar, porém, que o tema é polêmico e que a interpretação literal do art. 91, § 3º, induz à conclusão diversa.
O que nos parece claro, em face dos avanços contemplados no novo estatuto (se comparado com o regime jurídico anterior), é o dever das estatais de empreender esforços no sentido de adequar, o quanto antes, suas normas e procedimentos internos.