INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo analisar a aplicabilidade das Instruções Normativas n.º 05/2017 e n.º 06/2018 da Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão às estatais federais, à luz da Jurisprudência do Tribunal de Contas da União e do Decreto n.º 9.507/2018, haja vista que os normativos excluem estas entidades das suas previsões.
DAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS IN/SEGES/MPDG N.º 05/2017 E N.º 06/2018
A Instrução Normativa n.º 05/2017[1] busca prover o sistema de contratação e fiscalização dos contratos de prestações serviços com instrumentos objetivamente padronizáveis e com capacidade de afastar pagamento, via subsidiariedade, de verbas trabalhistas, sendo expressa ao destinar-se às contratações de serviços sob o regime de execução indireta realizadas pela Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, nos termos do seu art. 1º[2], sem menção às estatais.
Como cediço, a IN 05/2017 revogou a IN 02/2008, que disciplinava a contratação de serviços, continuados ou não, por órgãos ou entidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais – SISG, regulado pelo Decreto n.º 1.094/1994:
Art. 1º […]
§ 1º Integram o SISG os órgãos e unidades da Administração Federal direta, autárquica e fundacional, incumbidos especificamente da execução das atividades de que trata este artigo.
[…]
Destarte, a IN 02/2008 não era compulsória às estatais federais, porém, sempre foi utilizada, não só por segurança jurídica, mas com fundamento no Decreto n.º 2.271/97[3], que, regulando acontratação de serviços pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, dizia:
Art. 9º As contratações visando à prestação de serviços, efetuadas por empresas públicas, sociedades de economia mista e demais empresas controladas direta ou indiretamente pela União, serão disciplinadas por resoluções do Conselho de Coordenação das Empresas Estatais – CCE[4].
Ante à ausência de regulamentação deste art. 9º, o Plenário do Tribunal de Contas da União, através do Acórdão 1.215/2009[5], recomendou a utilização do modelo de contratação editado SLTI/MPOG mediante a IN 02/2018 às empresas públicas e sociedades de economia mista, ao argumento de que é fundamentado em preceitos constitucionais que devem ser observados por toda a Administração Pública, iniciando-se a aplicação das Instruções Normativas do, à época, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão às empresas estatais.
Ainda em razão da inércia em editar as Resoluções referidas no Decreto, o Plenário do TCU exarou o Acórdão n.º 1.521/2016[6] reforçando o entendimento que
[…] segundo jurisprudência deste Tribunal, em razão da ausência de normas que regulamentem o art. 9º do Decreto 2.271/1997, são aproveitadas às empresas estatais, por analogia, as disposições ali contidas, dirigidas à Administração Direta, Autárquica e Fundacional;
Pacificou-se, então, no âmbito do TCU, que todas as regulamentações do Decreto n.º 2.271/1997 destinadas às Administração direta, autárquica e fundacional, estender-se-iam às estatais, atraindo a submissão destas às Instruções Normativas emanadas pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.
Foi por ocasião deste último Acórdão que se editou a Portaria n.º 409/2016[7], dispondo sobre as garantias contratuais ao trabalhador na execução indireta de serviços e os limites à terceirização de atividades, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional e das empresas estatais federais controladas pela União, denotando que a cautela nas contratações envolvendo prestação indireta de serviços passava a integrar a agenda governamental.
Por seu turno, a edição da IN 05/2017 foi decorrência das recomendações propostas nos Acórdãos n.º 2.328/2015[8] e n.º 2.622/2015[9], ambos do Plenário do TCU, que buscaram aperfeiçoar a governança e a gestão das contratações realizadas pela Administração Pública Federal, e dos quais participaram a Comissão Interministerial de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias da União, tendo a CGPAR recebido recomendação expressa, no segundo julgado, para que “avaliem as orientações contidas no presente acórdão e adotem as medidas necessárias à implementação na sua esfera de atuação”, incentivando a regularização do art. 9º do Decreto n.º 2.271/97, que nunca ocorreu.
Estas orientações da Corte de Contas refletiram a intenção de inaugurar um novo paradigma de planejamento e contratação para toda a Administração Pública Federal, o que é admitido pelo Governo Federal no Portal Compras Governamentais[10], afirmando que o Acórdão n.º 2.622/2015 especificamente
Propôs várias medidas visando ao aperfeiçoamento da governança e da gestão das contratações realizadas pela Administração Pública Federal, merecendo destaque a constatação quanto à existência de disfunções existentes na atual metodologia para contratação de serviços, em especial dos que envolvem a contratação de serviços sob o regime de dedicação exclusiva (sic).
Porquanto a Portaria n.º 409/16 já alcançava as empresas estatais federais, ao excluí-las da Instrução Normativa 05/17, o Governo Federal confrontou o seu próprio posicionamento, que já admitia, no Portal suso referido que
A nova IN também objetivou adequar-se às disposições dessa Portaria que regulamenta o art. 9º do Decreto nº 2.271, 1997, em atenção aos Acórdãos nºs. 243/2002, 2.132/2010, 2.303/2012 e 1.521/2016 – TCU – Plenário, bem como procedimentalizar e sistematizar, de maneira geral, matérias que foram objeto de alterações jurisprudenciais e doutrinárias, indo ao encontro do que dispõe a Súmula 331 do TST, ou seja, implementa regras garantidoras do cumprimento da legislação trabalhista e mitigadoras de inadimplência por parte da prestadora de serviços.
O animus governamental era, de fato, estender às disposições da IN 05/2017 às estatais federais, regulando, assim, o art. 9º do Decreto nº 2.271, precipuamente como forma de proteger o erário de condenações subsidiárias ao pagamento de verbas trabalhistas, mas, por alguma impropriedade, estas entidades não foram abrangidas pelo texto do normativo.
Mantendo a política pública de buscar soluções que evitem e/ou mitiguem a condenação da Administração Pública Federal ao pagamento de verbas trabalhistas, especialmente em razão da Súmula n.º 331[11] do Tribunal Superior do Trabalho, editou-se a Instrução Normativa IN/SEGES/MPDGnº 06/2018[12], versando sobre cláusulas assecuratórias de direitos trabalhistas quando da execução indireta de obras públicas, contendo, porém, a mesma limitação redacional da IN 05 e excluindo, ao menos do seu texto, sua aplicação às empresas estatais[13].
A nóvel Instrução Normativa contém condições mínimas que devem ser observadas quando da contratação de obras públicas, apresentando critérios a serem exigidos das empresas contratadas, além de prerrogativas da fiscalização para aferir o cumprimento das obrigações trabalhistas por parte das empreiteiras, entendendo o Poder Executivo Federal que, mediante estas regulações, as contratações serão mais eficientes e seguras ao patrimônio público, o que engloba, sobremaneira, as empresas estatais federais, haja vista que são executora de políticas públicas e as fazem , muitas vezes, por meio de obras públicas.
Não obstante a exclusão das empresas estatais de sua redação, pelo arcabouço argumentativo exposto, fundamentalmente lastreado pela jurisprudência do Tribunal de Contas da União, a Instrução Normativa nº 06/2018 aplica-se às estatais federais do mesmo modo que a Instrução Normativa nº 05/2017.
Reforçando o entendimento aqui defendido, acrescenta-se que a Lei n.º 13.303/2016[14], ao regular o §1º do art. 173 da Constituição Federal[15] dispondo sobre o estatuto jurídico das empresas estatais, trouxe inovações em questões de governança e integridade à gestão administrativa, além de impor padronização ao procedimento licitatório e contratual[16], tendo, assim, uma função de renovação e aprimoramento no modelo de gestão das empresas estatais que podem, para tanto, utilizar-se das Instruções Normativas objeto do presente estudo para uma gestão aprimorada de suas contratações, evitando prejuízos e mal uso do dinheiro público.
A Lei das Estatais dispõe, outrossim, sobre uniformização e ausência de responsabilidade pelos encargos trabalhistas[17], preceitos igualmente trazidos pelas Instruções Normativas, corroborando sua aplicação às estatais federais.
É de se acrescentar a edição do recentíssimo Decreto n.º 9.507/2018[18] que revogou expressamente o Decreto n.º 2.271/97. Infere-se, que o nóvel regramento, abrange as estatais controladas pela União, impondo-as o mesmo regime de contratação de serviços mediante execução indireta da administração direta, autárquica e fundacional, apresentando exigências visando garantir o cumprimento de obrigações trabalhistas por parte das empresas contratadas[19].
Destarte, ainda que o Decreto usado como referência pela jurisprudência do Tribunal de Contas da União tenha sido revogado, o entendimento foi mantido, estendendo às estatais federais, doravante não mais por analogia, mas por expressa previsão, dos mesmos parâmetros de contratação administração direta, autárquica e fundacional, inclusive por ser expressa manifestação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, que afirmou que “dessa maneira (com a edição do Decreto), os procedimentos serão unificados em todo o serviço público federal”[20], o que atrai, sobremaneira, a adoção das Instruções Normativas IN/SEGES/MPDGnº 05/2017 e n.º 06/2018 às entidades aqui estudadas.
CONCLUSÃO
A par do que foi explanado, conclui-se que as Instruções Normativas IN/SEGES/MPDG n.º 05/2017 e nº 06/2018 devem ser usadas pelas empresas estatais federais em suas contratações para prestação de serviço mediante execução indireta e para execução de obras públicas, com respaldo na jurisprudência consolidada do Tribunal de Contas da União e por refletirem uma agenda governamental comprometida com a mitigação de condenações subsidiárias ao pagamento de encargos trabalhistas pela Administração Pública Federal, fundamentos em prol de uma gestão pública mais eficiente e menos onerosa, pautada em critérios objetivamente padronizados e em boas práticas de governança.
De mais a mais, a Lei n.º 13.303/2016, ao dispor sobre as exigências de transparência, governança corporativa, planejamento e padronização como formas de ampliar a regularidade nas contratações realizadas pelas empresas estatais, reforça interpretação defendida, ampliando o alcance das Instruções Normativas às estatais federais, legitimando-as para fruir das normatizações sob estudo.
A edição do Decreto n.º 9.507/2018, que revogou o Decreto n.º 2.271/97, dispôs sobre a contratação de serviços mediante execução indireta da administração direta, autárquica, fundacional e estatais controladas pela União, unificando e padronizando o procedimento de contratação do Executivo Federal, reforçando a aplicação das Instruções Normativas IN/SEGES/MPDG n.º 05/2017 e nº 06/2018 àquelas pessoas jurídicas de direito privado.
[7] https://www.comprasgovernamentais.gov.br/index.php/legislacao/portarias/561-portaria-n-409-de-21-de-dezembro-de-2016
[11]Súmula nº 331 do TST: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
[14] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm
§ 1o A inadimplência do contratado quanto aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à empresa pública ou à sociedade de economia mista a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.