De que forma deve ser comprovada a notória especialização do profissional ou da empresa a ser contratada com fundamento na inexigibilidade de licitação tratada, por exemplo, no inciso II do art. 13 do novo Regulamento de Licitações e Contratos do SENAC?

O § 2° do art. 13 do Regulamento de Licitação e Contratos do SENAC[1] estabelece:

“Art. 13. A licitação será inexigível quando houver inviabilidade de competição, a exemplo de:

(…)

§ 2.º Para fins do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se de notória especialização o profissional ou a empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiência, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica ou outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e reconhecidamente adequado à plena satisfação do objeto do contrato.”

A notória especialização do profissional ou da empresa a ser contratada – entendida como a especial qualificação do prestador no seu ramo de atuação – é um dos requisitos que a hipótese de inexigibilidade de licitação examinada requer[2] e do teor do contido no § 2º do art. 13 do Regulamento referido depreende-se que a comprovação dessa deve ser feita mediante a apresentação de documentos hábeis que evidenciem, em face da atuação e experiência anterior do proponente, que ele é o mais adequado para executar os serviços desejados.

E por documentos hábeis pode-se citar, sem a pretensão de esgotar os meios possíveis, trabalhos realizados, metodologias empregadas, publicações feitas, certificações obtidas etc., os quais, aliás, podem se encontrar compilados em currículo do profissional ou portfólio da empresa, sendo relevante que, de fato, reste demonstrada a qualificação superior do proponente que o torne diferenciado dos demais que atuam na mesma área e, em decorrência, o mais preparado para bem executar objeto peculiar da contratação.

É como aponta o Tribunal de Contas da União e destaca a doutrina:

“Para ele, os demais requisitos da espécie “são de mais fácil identificação: os serviços técnicos estão previstos no art. 13 da Lei de Licitações, e a notoriedade do profissional especializado pode ser comprovada por meio de documentos hábeis para tanto, como: diplomas, participações em eventos, cursos ministrados etc”. Ao final, o relator propôs e o Plenário decidiu expedir determinação corretiva ao Confea. Precedente citado: Acórdão n.º 852/2008-Plenário.”[3] (grifou-se)

“Acrescente-se que a parte final do §1° do art. 25 consigna exigência de suma importância, dado que os elementos em apreço devem revelar que o trabalho do especialista é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato.

Essa parte final do dispositivo prescreve a obrigatoriedade de nexo entre as características do profissional qualificado e a plena satisfação do objeto do contrato. Melhor dizendo, o objeto do contrato é que determina o tipo de especialista a ser contratado. Logo, a Administração Pública é obrigada a avaliar as atividades desenvolvidas pelo especialista, qual a linha que ele segue, quais os aportes teóricos e quais as técnicas que ele assume, a fim de precisar se é realmente ele e não outro o profissional mais indicado, a teor do critério administrativo fundado na confiança, para cumprir os objetivos a que visa aportar o contrato a ser firmado.”[4] (grifou-se)

Notoriamente especializado será, assim, o profissional ou empresa que, detendo especial qualificação, desfrute de um certo conceito e se diferencie, exatamente por isso, daqueles do mesmo ramo ou segmento de atuação.

HELY LOPES MEIRELLES ao realizar pertinente abordagem do assunto, em lição ainda atual, afirma que a notória especialização “… é o reconhecimento público da alta capacidade profissional. Notoriedade profissional é algo mais que habilitação profissional. Esta é a autorização legal para o exercício da profissão; aquela é a proclamação da clientela e dos colegas sobre o indiscutível valor do profissional na sua especialidade. Notoriedade é, em última análise, para fins de dispensa de licitação, a fama consagradora do profissional no campo de sua especialidade.”[5] (grifou-se)

Acrescenta, outrossim, que “… o Estatuto baseia a notória especialização no ”conceito”, isto é, na boa reputação, na boa fama, na consideração, no respeito, no renome que distingue o profissional ou empresa ”no campo de sua especialidade”, e indica alguns requisitos objetivos para a sua aferiçãodesempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica – mas sem tolher a liberdade de a Administração louvar-se em outros, relacionados com as atividades do futuro contratado (Decreto-lei nº 2.300/86: art. 12, parágrafo único).” (grifou-se)

CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO observa que “… o caso da notória especialização diz respeito a trabalho marcado por características individualizadoras” (7). A advertência feita por ADILSON ABREU DALLARI é no sentido de que “Não se confunda notoriedade com popularidade”, deixando certo, ainda, que “não é necessário que o contratado seja tido como reconhecidamente capaz pelo povo, pela massa, pelo conjunto dos cidadãos, pela coletividade. Basta que isto aconteça no âmbito daquelas pessoas que operam na área correspondente ao objeto do contrato.”[6]

Traz a Lei nº 8.666/93, como visto em dispositivo já transcrito (art. 25, § 1º), elementos que se prestam, exemplificativamente, à adequada caracterização das hipóteses possíveis, traçando ali parâmetros a serem observados pelo administrador para o correto enquadramento dos casos que lhe sejam submetidos.”[7] (grifou-se)

Luiz Cláudio de Azevedo Chaves sintetiza:

“Destarte, com base no que aqui foi exposto, podemos sintetizar que a notória especialização, como requisito de eficácia e legalidade na contratação de serviços singulares, apresenta os seguintes caracteres:

a) a notória especialização não exige fama ou formação acadêmica específica, pois não há qualquer apontamento nesse sentido e, portanto, não pode receber interpretação mais restritiva;

b) os atributos elencados no art. 25, § 1º da Le. 8.666/1993 são exemplificativos, quer dizer, o motivo que fará o gestor decidir a favor deste ou daquele profissional ou empresa pode não estar descrito expressamente no dispositivo;

c) não é necessário que a motivação indique mais de um atributo, bastando o apontamento de uma razão, desde que razoável;

d) A escolha é ato puramente discricionário, não cabendo avaliação de valor por parte das Assessorias Jurídicas, que devem limitar a sua análise de regularidade quanto à verificação da existência de motivação;

e) A empresa será considerada notória especialista em razão dos atributos relacionados à atividade e estrutura empresarial, notadamente, organização, aparelhamento e equipe técnica (corpo docente);

Com essas linhas, espera-se que os profissionais da Administração Pública e das entidades do sistema ‘S’ que instruem no dia a dia processos de contratação de serviços singulares, possam melhor desenvolver as suas atribuições, com maior clareza e segurança na indicação de profissionais ou empresas notórias especialistas.”

De todo o exposto tem-se, enfim, que a notória especialização do profissional ou da empresa a ser contratada deve ser comprovada por todo e qualquer documento apto para esses fins, a exemplo dos citados no dispositivo reproduzido, não existindo, porém, um rol específico e taxativo, até porque os objetos das contratações são variáveis e sujeitos a mercados e regras cambiáveis.


[1] No mesmo sentido a previsão constante nos Regulamentos de Licitações e Contratos do SESC, do  SENAR, do SESCOOP, do SENAT e do SEST. Redações similares também se encontram no § 2° do art. 14 do Regulamento do SEBRAE, no § 1° do art. 14 do Regulamento da APEX e no parágrafo único do art. 11 do Regulamento da ABDI. Já os Regulamentos do SESI e do SENAI não tratam do tema.

[2] Que exige, ainda, objeto singular e relativo a serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual.

[3] TCU. Acórdão 658/2010.

[4] NIEBUHR, Joel de Menezes. Dispensa e inexigibilidade de licitação pública, São Paulo: Dialética, 2003, p. 195.

[5] Op. cit., p. 54.

[6]  Aspectos jurídicos da Licitação – São Paulo: Saraiva, 1992, 3ª ed., p. 39.

[7] NOBREGA. Airton Rocha. Disponível em https://jus.com.br/artigos/4737/contratacao-direta-por-notoria-especializacao

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