- Introdução. Â
A discricionariedade administrativa é um princÃpio fundamental no Direito Administrativo, permitindo ao agente um espaço para tomar decisões que atendam ao interesse público dentro dos limites da lei. No entanto, para que essa liberdade de escolha não se transforme em arbitrariedade, é essencial que as entidades sigam parâmetros claros, especialmente em processos licitatórios, onde a transparência e a impessoalidade são indispensáveis. O Tribunal de Contas da União (TCU), por meio do Acórdão 1998/2024, aborda justamente a importância de critérios objetivos para garantir a imparcialidade e clareza no julgamento de propostas, destacando os limites do poder discricionário dos gestores em processos de contratação no âmbito do Sistema S.
Neste artigo, abordaremos o entendimento do TCU sobre a importância dos critérios objetivos na qualificação técnica, e como esse entendimento se conecta com a prática da discricionariedade administrativa nas entidades do Sistema S, especialmente com os impactos da ausência de parâmetros claros observados no Pregão Eletrônico realizado por entidade do Sistema S.
2. Principais Pontos do Acórdão 1998/2024Â
O Acórdão 1998/2024 do TCU examinou falhas no Pregão Eletrônico, promovido por entidade do Sistema S para contratação de serviços técnicos de recrutamento e seleção de pessoal. A ausência de parâmetros objetivos para qualificação técnica no edital resultou em desclassificações e inabilitações de forma questionável. A seguir, destacam-se os principais pontos do acórdão:
1. Ausência de Parâmetros Objetivos para Qualificação Técnica:
O TCU constatou que o edital não definia critérios claros para a comprovação da capacidade técnico-operacional das licitantes, gerando subjetividade na análise de documentos. Essa ausência comprometeu a transparência e a impessoalidade, princÃpios essenciais para um processo licitatório justo e isonômico.
2. Utilização de Exigências Não Previstas no Edital:
A entidade utilizou critérios técnicos adicionais, como exigência de experiência sênior, que não estavam previstos no edital. O TCU enfatizou que a inclusão de critérios não previstos infringe o princÃpio da vinculação ao edital, prejudicando a previsibilidade e segurança jurÃdica para os participantes.
3. Desclassificação Sem Fundamentação Adequada:
Diversas empresas foram desclassificadas sem possibilidade de demonstrar a exequibilidade de suas propostas, prática contrária à jurisprudência do TCU, que prevê o direito de defesa aos licitantes. A análise técnica foi subjetiva, afastando-se dos parâmetros exigidos pelo próprio Tribunal.
4. Recomendação de Critérios Objetivos em Futuros Editais:
O TCU recomendou à entidade que adote critérios claros em futuros certames, especificando quantitativos mÃnimos e parâmetros técnicos conforme a Súmula 263 do TCU, a qual permite a exigência de quantitativos mÃnimos desde que limitados à s parcelas de maior relevância do objeto contratado.
5. Respeito à Vinculação ao Edital:
O TCU reforçou que o edital deve ser seguido rigorosamente para garantir transparência e isonomia, evitando a adoção de critérios subjetivos que não estejam expressamente previstos.
Discricionariedade e Qualificação Técnica nos Processos Licitatórios
Nos processos licitatórios, a discricionariedade administrativa permite que o agente avalie a qualificação técnica dos licitantes para assegurar que a empresa selecionada tenha capacidade de executar o objeto do contrato. Esse poder discricionário, no entanto, não é absoluto: ele deve ser exercido dentro de parâmetros objetivos estabelecidos pelo edital, de forma a garantir a impessoalidade e a transparência do processo. Em outras palavras, a discricionariedade deve respeitar limites legais e os princÃpios administrativos, como o da vinculação ao instrumento convocatório.
O Acórdão 1998/2024 do TCU analisa uma representação sobre Pregão Eletrônico conduzido por entidade do Sistema S, no qual foram identificadas irregularidades relacionadas à ausência de critérios claros para a qualificação técnica das empresas participantes. Em sua análise, o TCU destacou que a falta de parâmetros objetivos no edital para a avaliação da capacidade técnico-operacional contraria os princÃpios de transparência, impessoalidade e julgamento objetivo, essenciais para a lisura dos processos licitatórios.
A discricionariedade administrativa aplicada na fase de qualificação técnica permite ao gestor avaliar a compatibilidade entre os serviços prestados anteriormente pelo licitante e o objeto da licitação. No entanto, o uso de critérios subjetivos ou não especificados no edital compromete o princÃpio da impessoalidade, pois abre espaço para decisões arbitrárias ou inconsistentes.
No caso do Pregão Eletrônico em questão, o TCU apontou que a inabilitação de licitantes se baseou em critérios técnicos que não estavam previstos no edital, como a experiência mÃnima de profissionais seniores e o uso de sistemas especÃficos de recrutamento e seleção. Embora esses requisitos possam ser importantes para assegurar a qualidade do serviço, o TCU observou que a sua inclusão sem previsão no edital trouxe uma carga excessiva de subjetividade ao julgamento, violando o princÃpio do julgamento objetivo. De acordo com o TCU, a entidade deve estabelecer claramente os requisitos técnicos e as experiências mÃnimas necessárias para a habilitação, limitando a discricionariedade a uma avaliação objetiva e transparente.
A Importância dos Parâmetros Objetivos e o Acórdão 1998/2024 do TCU
O Acórdão 1998/2024 destaca que a discricionariedade administrativa não pode justificar o uso de critérios arbitrários na habilitação de licitantes. O TCU reforça que, para assegurar a transparência e a competitividade do processo, o edital deve definir parâmetros claros de qualificação técnica, conforme preconizado pela Súmula 263 do TCU. Esta súmula permite a exigência de quantitativos mÃnimos para a comprovação da capacidade técnico-operacional, desde que limitada à s parcelas de maior relevância e valor do objeto a ser contratado.
Além disso, o TCU considera irregular o uso de critérios não previstos no edital, por entender que eles geram insegurança jurÃdica e limitam a competitividade do certame. No caso analisado, a entidade desclassificou diversas empresas com base em exigências de experiência e estrutura que não constavam no edital, justificando as desclassificações por meio de diligências subjetivas e sem fundamentação objetiva. Para o TCU, essa conduta viola os princÃpios da transparência e da objetividade, uma vez que as regras de avaliação devem estar previamente definidas e acessÃveis a todos os participantes.
O Acórdão 1998/2024 do TCU reforça que o poder discricionário não significa liberdade ilimitada para o agente, mas sim um espaço para a Administração tomar decisões dentro dos limites da lei e de forma justificada. Em processos licitatórios, a discricionariedade deve sempre ser exercida com base em critérios objetivos e estabelecidos no edital, de modo a proteger os princÃpios da isonomia, impessoalidade e legalidade. Essa postura visa a impedir que exigências subjetivas afetem o julgamento das propostas, preservando a transparência e a confiança no processo licitatório.
A adoção de critérios objetivos limita a subjetividade e reduz o risco de inabilitações indevidas, permitindo que a entidade contrate empresas qualificadas com maior segurança e previsibilidade. A ausência desses critérios transforma o poder discricionário em um fator de insegurança e favorece interpretações arbitrárias que podem desqualificar licitantes aptos.
ConclusãoÂ
A análise do Acórdão 1998/2024 do TCU deixa claro que a discricionariedade administrativa nos processos de contratação do Sistema S deve estar fundamentada em parâmetros objetivos e estabelecidos no edital, especialmente na fase de qualificação técnica. A falta de clareza nos requisitos de habilitação compromete a transparência, o julgamento objetivo e a impessoalidade, violando os princÃpios fundamentais que regem as contratações das entidades do Sistema S.
Os critérios de qualificação técnica, quando previstos com objetividade e clareza, permitem que o gestor avalie as propostas de maneira justa e segura, assegurando que apenas empresas com capacidade técnica comprovada sejam habilitadas. O Acórdão 1998/2024 destaca a responsabilidade do agente em respeitar os limites de sua discricionariedade e a importância da vinculação ao edital, para que o processo licitatório seja conduzido de maneira eficiente e em conformidade com o interesse público.
Bibliografia:Â
– BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
– DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade Administrativa na Constituição de 1988. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2012..
– TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Acórdão 1998/2024 – Plenário. Representação. Relator: Ministro Walton Alencar Rodrigues. DisponÃvel em: https://portal.tcu.gov.br . Acesso em: 10 nov 24.
– TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Súmula 263 do TCU.