EMPRESA COM DIREITO DE LICITAR SUSPENSO OU DECLARADA INIDÔNEA TEM DIREITO A IMPUGNAR EDITAL E/OU OBTER ESCLARECIMENTOS SOBRE CERTAMES PÚBLICOS?

Para condutas graves praticadas no âmbito dos processos licitatórios, a Lei nº 8.666/1993 previu penas igualmente graves, de modo a sancionar os licitantes faltosos e impedi-los, temporariamente, de participar de certames públicos.
Estamos nos referindo às penas de suspensão do direito de licitar e contratar com a Administração sancionadora (art. 87, III) e a declaração de inidoneidade (art. 87, IV).
Durante o prazo fixado para vigência da pena, o particular tem seu direito de licitar e contratar obstaculizado, não possuindo, consequentemente, condições para participar dos certames públicos, respeitados o âmbito de abrangência de cada penalidade.[1][2]
De todo modo, tais penas não impedem que o particular obtenha informações prévias acerca do certame, através de pedidos de esclarecimentos e, também, não lhe retira o direito de impugnar os termos do edital. Isso porque esses procedimentos prévios à abertura da competição em si são públicos e qualquer cidadão pode sobre eles interferir, seja através do pedido de esclarecimento ou da apresentação de impugnação.
Nessa linha, dispõe a Lei Geral de Licitações:

“Art. 40.  O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:
(…)
VIII – locais, horários e códigos de acesso dos meios de comunicação à distância em que serão fornecidos elementos, informações e esclarecimentos relativos à licitação e às condições para atendimento das obrigações necessárias ao cumprimento de seu objeto;
(…)
Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada.
§ 1º Qualquer cidadão é parte legítima para impugnar edital de licitação por irregularidade na aplicação desta Lei, devendo protocolar o pedido até 5 (cinco) dias úteis antes da data fixada para a abertura dos envelopes de habilitação, devendo a Administração julgar e responder à impugnação em até 3 (três) dias úteis, sem prejuízo da faculdade prevista no § 1º do art. 113.
§ 2º Decairá do direito de impugnar os termos do edital de licitação perante a administração o licitante que não o fizer até o segundo dia útil que anteceder a abertura dos envelopes de habilitação em concorrência, a abertura dos envelopes com as propostas em convite, tomada de preços ou concurso, ou a realização de leilão, as falhas ou irregularidades que viciariam esse edital, hipótese em que tal comunicação não terá efeito de recurso. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)
§ 3º A impugnação feita tempestivamente pelo licitante não o impedirá de participar do processo licitatório até o trânsito em julgado da decisão a ela pertinente.” (grifou-se)

A respeito, oportuno os apontamentos da doutrina e as sinalizações da jurisprudência, respectivamente:

A Lei 8.666/1993 atribuiu legitimação ativa a qualquer cidadão para provocar, na via administrativa, análise de eventual vício no ato convocatório. (…) A Administração é obrigada a exercitar o controle da legalidade do ato convocatório da licitação, especialmente quando provocada (nos prazos indicados na Lei) por qualquer pessoa. Não pode se escusar sob invocação de que o particular não teria interesse em participar da licitação ou que não preencheria, nem mesmo em tese, os requisitos para tanto”.[3] (grifou-se)

“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PERMISSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. EDITAL.
1. Não se configura litispendência quando as partes litigantes são distintas, bem como a causa de pedir deduzida no mandado de segurança e em ação cautelar e ordinária.
2. ‘Se a impetrante reveste a qualidade de empresa cujo objetivo consiste na exploração de serviços de transporte rodoviário, possui legitimidade para, pela via mandamental, impugnar edital de concorrência sob alegativa de violação ao princípio da legalidade, ainda que não seja licitante.’ Preclusão.
3. Não se configura a liquidez e certeza do direito quando a comprovação do quanto alegado depende de dilação probatória.
4. Inexiste ilegalidade ou abusividade na prática de ato administrativo que dá exato cumprimento a disposições legais e constitucionais.
5. Denegação da segurança.”[4] (grifou-se)

“[RELATÓRIO] 33. Tal argumento não pode prosperar, uma vez que o art. 41, § 1º, da Lei 8.666/93, estabelece que qualquer cidadão é parte legítima para impugnar edital de licitação por irregularidade na aplicação desta lei, devendo a Administração julgar e responder à impugnação em até 3 (três) dias úteis.
34. Dessa forma, independentemente de tratar-se de empresa que tenha sido declarada inidônea pela Administração Municipal, ela poderia, na condição de interessado, apresentar impugnação ao edital, cabendo obrigatoriamente ao município julgar a impugnação no prazo estipulado, pois o pedido de impugnação de edital não é restrito às licitantes.
[VOTO] 4. Os responsáveis alegam que o pedido não foi julgado porque o recorrente estaria impedido de participar de licitações no município. Entretanto, o art. 41, § 1º, da Lei 8.666/93 estabelece que qualquer cidadão é parte legítima para impugnar edital de licitação por irregularidade na aplicação desta lei, devendo a Administração julgar e responder à impugnação em até 3 (três) dias úteis. Portanto, independentemente de ter sido declarada inidônea, a empresa poderia, na condição de interessado, apresentar impugnação ao edital, cabendo obrigatoriamente ao município julgá-la no prazo legal, visto que o pedido de impugnação de edital não é restrito às licitantes e pode, por outro lado, interessar a todas as participantes do certame.”[5] (grifou-se)

A impugnação, aliás, independentemente da fundamentação ou mesmo quando apresentada fora do prazo, deve ser apreciada e respondida pelo órgão ou entidade em prestígio do direito de petição, a todos assegurado pela Constituição Federal (art. 5º, XXXIV), como bem aponta o TCU:

“Independentemente da modalidade de licitação realizada, o licitante e o cidadão têm direito a obter resposta para petições encaminhadas ao órgão licitador, ainda que improcedentes ou sem fundamentação legal”.[6]

“1.5. Determinações/Recomendações/Orientações: 1.5.1. alertar o Sesc/SP, quanto às seguintes impropriedades: (…) 1.5.2. ausência de apreciação da impugnação formulada em face do edital do Pregão Presencial nº 20/2010, o que não se coaduna com os preceitos insculpidos no art. 5º, incisos XXXIII e XXXIV, ‘a’, da Magna Carta.”[7]

Portanto, as penas de suspensão do direito de licitar e contratar com a Administração e a declaração de inidoneidade retiram do particular o direito de participar de licitações públicas e de ser contratado por órgãos ou entidades públicos (durante o prazo de vigência da sanção e de acordo com seu âmbito de abrangência), no entanto, não lhe retira o direito de petição, podendo, então, solicitar esclarecimentos sobre editais e impugnar seus termos.


[1] Enquanto a declaração de inidoneidade impede o particular de licitar e contratar com toda a Administração P;ublica, a penalidade prevista no art. 87, III, da Lei 8.666 tem âmbito de abrangência restrito ao órgão ou entidade que aplicou a sanção, conforme entendimento majoritário do Tribunal de Contas da União: “3. O edital da licitação, ao estabelecer vedações à participação no certame, deve ser suficientemente claro no sentido de que a penalidade de suspensão para licitar e contratar, prevista no art. 87, inciso III, da Lei 8.666/93, tem abrangência restrita ao órgão ou entidade que aplicou a sanção.” TCU. Acórdão 2556/2013. Plenário.
[2] A Lei nº 10.520/2002 também previu, em seu art. 7º, pena grave específica para a modalidade pregão, que impede o particular sancionado de licitar e contratar, por até cinco anos, no âmbito do ente federativo ao qual pertence o órgão ou entidade sancionadora.
[3] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 769-771.
[4] STJ. MANDADO DE SEGURANÇA N° 5.963 – DF.
[5] TCU. Acórdão 365/2017. Plenário.
[6] Brasil. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4. ed. rev., atual. e ampl. – Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência: Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010, p. 841.
[7] TCU. Acórdão 6627/2010. Segunda Câmara.

Ana Carolina Coura Vicente Machado

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