Margem de Preferência nas Compras Públicas: A Nova Regulamentação pelo Decreto nº 12.218/2024 

Introdução 

O Decreto nº 12.218, de 11 de outubro de 2024, estabelece novas diretrizes para a aplicação da margem de preferência nas licitações públicas, regulamentando o artigo 26 da Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações. Esse mecanismo permite que produtos e serviços nacionais tenham prioridade sobre alternativas estrangeiras, visando fortalecer a indústria brasileira e promover a inovação tecnológica e a sustentabilidade. Com a introdução dessas novas normas, o governo utiliza o poder de compra estatal como uma ferramenta estratégica para fomentar o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade nas contratações públicas. 

Este artigo explora os principais pontos do Decreto nº 12.218/2024 e como ele busca transformar as compras públicas em um vetor de incentivo à produção nacional e à inovação. 

Margem de Preferência: Conceitos e Aplicação 

A margem de preferência é um diferencial de preço que a administração pública pode aplicar em licitações para beneficiar produtos e serviços nacionais. Esse diferencial pode ser de até 10% para bens e serviços que atendam a normas técnicas brasileiras e, adicionalmente, mais 10% para produtos que resultem de inovação tecnológica desenvolvida no país, totalizando até 20% de vantagem.  

O Decreto define dois tipos de margem de preferência: 

1. Margem de Preferência Normal: Aplicada em até 10% para produtos e serviços nacionais, incluindo aqueles que apresentam características sustentáveis, como bens recicláveis, reciclados ou biodegradáveis. 

2. Margem de Preferência Adicional: Somada à margem normal, oferece mais 10% para bens e serviços com inovação tecnológica, desde que desenvolvidos e fabricados no Brasil. Esse incentivo visa promover setores de alta tecnologia e incentivar a pesquisa e o desenvolvimento. 

Essas margens têm o objetivo de aumentar a competitividade dos produtos e serviços nacionais, especialmente nas áreas onde o país já possui uma base produtiva e potencial de inovação. 

Critérios para a Aplicação da Margem de Preferência 

O Decreto nº 12.218/2024 detalha os critérios para classificar um produto ou serviço como nacional. Produtos e serviços que pretendam receber a margem adicional devem: 

– Ser produzidos em território nacional com etapas fundamentais do processo produtivo realizadas no Brasil; 

– Apresentar inovações significativas em qualidade ou desempenho, diferenciando-se de produtos já existentes; 

– Possuir registro ativo no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), o que comprova a origem e o compromisso de inovação dentro do país. 

A comprovação da nacionalidade e da inovação ocorre durante a fase de habilitação na licitação, onde o fornecedor deve fornecer documentação para atender às exigências do Decreto. 

Implementação da Margem de Preferência nas Plataformas de Compras Públicas 

Para facilitar a aplicação das margens de preferência e assegurar a transparência no processo licitatório, o Decreto determina que o portal compras.gov.br passe a aplicar automaticamente as margens de preferência. Isso significa que as ofertas serão automaticamente classificadas de acordo com os percentuais de benefício, garantindo que os produtos e serviços nacionais aptos a receber a margem de preferência sejam destacados nas licitações. 

Para os órgãos que não utilizam o portal compras.gov.br, o Decreto recomenda que sistemas próprios sejam adaptados para incorporar as margens de preferência, unificando o processo em todas as esferas da administração pública federal, autárquica e fundacional. 

Expansão para Estados e Municípios 

Embora a aplicação da margem de preferência seja obrigatória apenas para a administração pública federal, estados e municípios também podem optar por adotar essas margens ao utilizarem recursos oriundos de transferências voluntárias da União. Isso permite que a política de incentivo se estenda a diferentes níveis de governo, beneficiando a indústria nacional em todo o território brasileiro. 

Papel da Comissão Interministerial de Contratações Públicas Sustentáveis (CICS) 

O Decreto nº 12.218/2024 cria a Comissão Interministerial de Contratações Públicas Sustentáveis (CICS), formada por representantes de ministérios e instituições, como o BNDES e a FINEP. A CICS é responsável por: 

– Definir os produtos e serviços que se qualificam para as margens de preferência; 

– Avaliar a viabilidade econômica e o impacto de cada margem de preferência proposta; 

– Monitorar e avaliar a eficácia das margens de preferência no estímulo à indústria nacional e à inovação; 

– Garantir que as contratações estejam alinhadas com as políticas de desenvolvimento sustentável e de transformação ecológica do país. 

A CICS, em sua função de governança das contratações públicas sustentáveis, é fundamental para assegurar que as margens de preferência cumpram seu papel estratégico, alinhando o poder de compra estatal com os objetivos de desenvolvimento econômico, social e ambiental. 

Conclusão 

O Decreto nº 12.218/2024 representa um avanço importante na política de compras públicas no Brasil. Com diretrizes claras e critérios detalhados, a regulamentação da margem de preferência fortalece a indústria nacional, incentiva a inovação tecnológica e promove práticas sustentáveis nas contratações públicas. A criação da CICS destaca o compromisso do governo com uma política industrial estratégica, que visa transformar as compras públicas em um instrumento de desenvolvimento nacional. 

Ao alinhar o uso do poder de compra do Estado com objetivos de desenvolvimento, o Decreto nº 12.218/2024 impulsiona o crescimento de setores estratégicos, promove a geração de empregos e contribui para uma economia mais sustentável e competitiva. Assim, a margem de preferência torna-se não apenas um incentivo econômico, mas uma ferramenta central na construção de um país mais inovador e comprometido com o desenvolvimento sustentável. 

Referências Bibliográficas 

Brasil. Decreto nº 12.218, de 11 de outubro de 2024. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/decreto/D12218.htm#art1. Acesso em 11 nov 24. 

Brasil. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14133.htm. Acesso em: 11 nov 24. 

TCU. Disponível em https://licitacoesecontratos.tcu.gov.br/801-2/. Acesso 11 nov 24. 

Roberta Luanda Ambrósio

Publicações recentes

DAS IMPUGNAÇÕES, DOS PEDIDOS DE ESCLARECIMENTO E DOS RECURSOS NAS DISPENSAS DE LICITAÇÃO

Por: , , e

Jamil Manasfi da Cruz[1] César Augusto Wanderley Oliveira[2] Felipe Dalenogare Alves[3] Hermes Alencar de Lima[4] RESUMO O artigo analisa a […]

4 de dezembro de 2024

Discricionariedade e Transparência nas Contratações das Entidades do Sistema S: Lições do Acórdão 1998/2024 do TCU 

Por:

A discricionariedade administrativa é um princípio fundamental no Direito Administrativo, permitindo ao agente um espaço para tomar decisões que atendam […]

18 de novembro de 2024

Controle Judicial da Discricionariedade Administrativa: Um Paralelo com a Atuação do Agente Público nos Processos Licitatórios e o Artigo 28 da LINDB 

Por:

1. Introdução:  A discricionariedade administrativa é um conceito central no Direito Administrativo e na atuação dos agentes públicos. Ela se […]

1 de novembro de 2024