Como vimos há um tempo aqui no blog JML, oequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo é a justa correlação entre todos os encargos que o particular terá com a prestação assumida e a remuneração respectiva pelo fornecimento do bem, execução da obra ou prestação do serviço, em conformidade com os termos da proposta apresentada, e a sua manutenção é assegurada pela Constituição Federal, art. 37, XXI.[1]
E para que o equilíbrio econômico-financeiro seja mantido durante todo o período de execução do contrato, rememora-se que o ordenamento jurídico prevê instrumentos específicos para tal finalidade. Tratam-se do reajuste, da repactuação (que é uma espécie de reajuste utilizada para contratos que envolvem serviços contínuos com dedicação exclusiva de mão de obra)e da revisão.
O reajuste de preços, como vimos no nosso post anterior, é cláusulas necessária dos contratos administrativos e deve ser adequadamente disciplinado pela Administração, na linha do que já previa a Lei nº 8.666/93[2] e também dispõe a Nova Lei de Licitações, a Lei nº 14.133/2021:
“Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento.
(…)
§ 7º Independentemente do prazo de duração do contrato, será obrigatória a previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado e com a possibilidade de ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos.”
Pois bem. Se disciplinado em edital/contrato, presentes os pressupostos necessários e aplicado o reajuste, é possível que, posteriormente, o mesmo contrato seja objeto de revisão?
Sim! É possível, porque reajuste e revisão têm fundamentos distintos. Enquanto o reajuste se trata de “procedimento automático, em que a recomposição se produz sempre que ocorra a variação de certos índices, independente de averiguação efetiva do desequilíbrio, (…) a recomposição [revisão] pressupõe a apuração real dos fatos e exige a comprovação de todos os detalhes relacionados com a contratação e os fatos supervenientes a ela”.[3]
O reajuste, portanto, tem por objetivo recompor o valor do contrato em virtude de fatores ordinários, previsíveis, sendo o principal deles o efeito inflacionário e, por isso mesmo, já se indica no contrato um índice de aplicação automática quando reunidos os pressupostos legais para que ocorra essa recomposição “normal” do valor contratual.
Em face disso é que um mesmo contrato pode sofrer, em um mesmo período de vigência, tanto reajuste como revisão de valores, quando a aplicação do índice de reajuste não for suficiente para recompor o equilíbrio econômico-financeiro inicialmente delineado.
A respeito, sinaliza o TCU:
“Ainda que a Administração tenha aplicado o reajuste previsto no contrato, justifica-se a aplicação da recomposição sempre que se verificar a presença de seus pressupostos, uma vez que o reajuste e a recomposição possuem fundamentos distintos. O reajuste, previsto nos arts. 40, inciso XI, e 55, inciso III, da Lei 8.666/1993, visa remediar os efeitos da inflação. A recomposição, prevista no art. 65, inciso II, alínea d, da Lei 8.666/1993, tem como fim manter equilibrada a relação jurídica entre o particular e a Administração Pública quando houver desequilíbrio advindo de fato imprevisível ou previsível com consequências incalculáveis.”[4] (grifou-se)
“(…) o reajuste objetiva compensar os efeitos da desvalorização da moeda nos custos de produção ou dos insumos utilizados, reposicionando os valores reais originais pactuados. Como se relaciona a fatores previstos antecipadamente, as partes estabelecem já nos termos do contrato, o critério para promover esse reequilíbrio (…)
8. Por outro lado, a revisão destina-se a corrigir distorções geradas por ocorrências imprevisíveis ou previsíveis com consequências inestimáveis. Nasce de acordo entre as partes, iniciado a partir de solicitação realizada por um dos contratantes, o qual deve demonstrar a onerosidade excessiva originada pelos acontecimentos supervenientes. Esse instrumento consta do art. 65, II, d, da Lei 8.666/1993 (…).”[5]
É bom destacar, no entanto, que a Nova Lei de Licitações trouxe uma inovação que influencia diretamente nesta questão do direito ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato. A Lei previu a possibilidade de se estabelecer no edital/contrato uma matriz de risco, que se constitui em “cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação estabeleceu a necessidade de se prever”. Ou seja, uma vez estabelecida a matriz de risco, posteriormente, a solução de eventuais pleitos das partes acerca do equilíbrio econômico-financeiro do contrato em face de eventos supervenientes deverá observar a alocação de riscos previamente estipulada na matriz (art. 104, § 3º).
Mas, de um modo geral, a aplicação de um reajuste não afasta de plano a possibilidade de uma posterior revisão, a qual deve ser analisada caso a caso, frente às cláusulas contratuais, o fato superveniente e seus efeitos decorrentes.
(…)
XI – critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela;
(…)
Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:
(…)
III – o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento (…).”