A GOVERNANÇA E A GESTÃO DE RISCOS NAS CONTRATAÇÕES DAS ENTIDADES DO SISTEMA S

A governança representa o modo como as instituições são dirigidas, com mecanismos de liderança, estratégia e controle, para a avaliar, direcionar e monitorar a gestão. Dentro desse escopo há a gestão de riscos.

De modo objetivo, o risco é o efeito da incerteza. É a possibilidade de algo acontecer e afetar negativamente os objetivos de uma organização. A gestão de riscos, por sua vez, é o processo utilizado para identificar, analisar, avaliar, tratar e monitorar os potenciais eventos e suas consequências. Trata-se na prática de uma excelente ferramenta de gestão utilizada para resguardar, proteger a organização. E, justamente por isso, é utilizada em diversas situações e pelas mais variadas pessoas jurídicas, inclusive, nas contratações públicas. A própria Lei n° 14.133/21, conhecida como a Nova Lei de Licitações, estabeleceu para a Administração Pública a necessidade de implementação da gestão de riscos, como sendo um processo apto a assegurar a eficiência a eficácia e a efetividade das contratações, sendo aplicável em todas as fases.

Todas essas considerações também podem ser aplicadas às Entidades do Sistema S. Inclusive, o TCU, pelo Acórdão 699/2016-TCU-Plenário, de relatoria do ministro Weder, recomendou a todas as entidades do ‘Sistema S’: “9.2.3. que envidem esforços para a melhoria dos seus processos de controle, estudando a viabilidade da implantação de unidades de auditorias internas, sem perder de vista a autonomia regional de cada departamento, a fim de aprimorar a eficácia dos seus processos de gerenciamento de riscos, controle e governança;…”.

Em vista dos resultados positivos da governança e da gestão de riscos tais mecanismos podem e devem ser utilizados nas licitações de tais entidades.

Efetuando uma analogia com as diretrizes da Lei n° 14.133/21, a gestão de riscos pode ser um processo interno aplicável na fase de planejamento, na seleção do fornecedor e na execução do contrato, ou representar uma gestão compartilhada com o fornecedor, por meio de uma matriz de riscos no contrato.

Inclusive, é importante mencionar o recente Regulamento de Licitações e Contratos do SESC e do SENAC (Resolução n° 1570/2023 e n° 1243/2023, respectivamente) que estabelece no art. 4° o conceito de matriz de risco, sendo, nos termos desse normativo, “cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação, devidamente prevista no edital”. Define também a obrigatoriedade da matriz de risco nas obras e serviços de engenharia de valores iguais ou superiores a 20 vezes o valor da modalidade concorrência (atualmente em R$ 2.465.000,00); nos regimes de contratação integrada ou semi-integrada; ou nas contratações que envolvam risco tecnológico.

A gestão de riscos pode atenuar ou evitar problemas nas contratações como: planejamento insuficiente, sobrepreço ou superfaturamento, inexecução contratual, falhas de fiscalização, direcionamento de licitação, aditamentos contratuais indevidos, contratação emergencial ocasionada por falha de planejamento, excesso de impugnação, judicialização, etc.

Há muitos frameworks disponíveis para implementação da gestão de riscos para as contratações, mas as principais etapas são a de (1) identificação do risco, originado de uma causa e com uma consequência; a (2) análise da probabilidade da sua ocorrência e do impacto; a (3) avaliação e priorização; o (4) tratamento a ser dado, como evitar, mitigar, aceitar e transferir; e, o  (5) monitoramento do risco.

Para entidades que não tenham incorporado essa ferramenta, recomenda-se que a implementação seja gradual e nas situações apontadas internamente como necessárias, ou seja, naquelas em que a probabilidade de ocorrência, em vista das características, do histórico, dos mecanismos de proteção, seja mediana ou alta e os impactos sejam consideráveis.

Como exemplo da gestão de riscos nas licitações, imagine-se uma contratação de serviços terceirizados de limpeza e conservação que apresenta as seguintes situações históricas: muitos questionamentos de licitantes e impugnações quanto aos documentos exigidos, pouco interesse de licitantes (baixa competitividade), dificuldades na fiscalização. Tais eventos devem ser transpostos em mapas de risco para incluir todos os elementos do gerenciamento, acima citados.

Vamos explorar um dos itens do nosso exemplo: a baixa competitividade. Primeiro (1) identifica-se o evento de risco estabelecendo a (1.1) causa, que pode ser excesso de exigências, falta de clareza das obrigações e demais cláusulas contratuais, dificuldades de obter informações da Comissão de Licitação, etc., e as consequências (1.2) aumento de questionamentos, aumento do valor do contrato, etc.; na sequência (2) analisa-se o risco, definindo que a (2.1) probabilidade de acontecer é alta, pois há um histórico de poucos licitantes nesse objeto, e o (2.2) impacto pode ser grave, considerando a imprescindibilidade dos serviços e riscos associados à contratações por urgência, caso não haja interessados e seja deserta a licitação; com base nessas informações (3) avalia-se definindo o risco como moderado, com curto prazo para implementar os controles; (4) apresenta-se o tratamento mais adequado, como mitigar, ao revisar o edital, os anexos e o contrato, ou contratar consultoria para elaborar o termo de referência, ou ainda, capacitar os integrantes do setor de elaboração dos documentos da licitação, na expectativa de reduzir a probabilidade de o risco se materializar e as consequências; e, por fim, (5) monitora-se o processo para identificar a efetividade do controle ou a materialização do evento.

Os ganhos desse gerenciamento refletem no conhecimento prévio das situações que possam representar obstáculos à melhor contratação e no planejamento dos controles necessários para evitar ou transferir as consequências desse risco, para orientar uma boa contratação.

Por fim, é importante que as Entidades do Sistema S conheçam essa ferramenta e seus benefícios, internalizando os procedimentos em normativos e apliquem sempre que necessário, viabilizando a eficiência, a eficácia e a efetividade das suas contratações, dentro de mecanismos de governança.

Caroline Rodrigues da Silva

Publicações recentes

Sistema S e o cabimento da adoção dos regimes de execução de contratação integrada e de contratação semi-integrada

Por:

Os Regulamentos de Licitações e Contratos do SESCOOP, SENAC, SESC, SENAR, SENAT e SEST[1]  preveem: “Art. 4.º Para os fins […]

13 de maio de 2024

Sistema “S” e justificativa de preço nas contratações diretas pautadas em inexigibilidade de licitação

Por:

As contratações das entidades integrantes do Sistema “S”, independente de decorrer de licitação ou não, devem respeito aos princípios que […]

30 de abril de 2024

Jurisprudência Comentada: Nova Lei de Licitações. Julgamento das propostas. Exame de inexequibilidade.

Por:

O critério definido no art. 59, § 4º, da Lei 14.133/2021 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, […]

22 de abril de 2024